DESAPARECIDA EM APARECIDA
João Eichbaum
Há cerca de um mês, um casal
de idosos, ele com 82 anos e ela com 77, tomou parte numa excursão à Basílica
de Nossa Senhora Aparecida. Ambos, fervorosos católicos, desses que gastam sua
velhice com atividades participativas na paróquia onde residem, foram a
Aparecida, movidos pela fé.
Lá chegados, entregara-se
ele à piedosa ocupação de acender velas para pedir ou agradecer benefícios da
Virgem Maria, enquanto sua esposa contemplava as belezas do templo. Ao
voltar-se para se juntar a ela, não a encontrou. Foi até a porta da igreja e
também não a viu. Meteu-se à sua procura entre os magotes de peregrinos que por
ali circulam o dia todo, sem sucesso.
Ela que, segundo consta, às
vezes tem a memória comprometida, teria dito a circunstantes, na porta da
igreja: “vou para casa”.
Desde aquele dia a família
não descansa e, embora já tenham sido mobilizados todos os meios, incluindo a
direção da igreja, a polícia e alguns meios de comunicação, até agora não há
pistas sobre o paradeiro da idosa.
Ontem, por acaso, me detive
por alguns minutos na TV Rede Vida. É um canal de televisão de propriedade dos
religiosos responsáveis pela basílica Nossa Senhora Aparecida. Naquele canal,
cujo objetivo principal é difusão de temas ligados à religião católica,
transmitem-se missas, sermões, fala-se muito no “amor de Deus” e nas “graças da
Senhora Aparecida”. Mas o que me chamou a atenção, verdadeiramente, foi um
quadro publicitário que apresenta pessoas prestando depoimentos, exaltando milagres, curas, graças e melhorias de vida,
atribuídas àquela personagem que a Virgem Maria encarna, sob o nome de Nossa
Senhora Aparecida.
Parece que a Virgem de Aparecida
discrimina, e discrimina sem critérios. Enquanto “concede graças” para alguns,
deixa que o destino se encarregue de fazer o que quiser com uma senhora idosa,
sem rumo, sem referência, que outra coisa não faz na vida senão rezar e pedir
graças. O misterioso desaparecimento, de dentro do Santuário, que tem a denominação
de Aparecida, soa como verdadeira contrapropaganda.
E o resultado dos insucessos
das orações perante a Senhora Aparecida é que os familiares da desaparecida já
estão correndo atrás de curandeiros e espíritas, em busca do benefício que lhes
foi negado.
Isso é a prova de que aquilo
a que denominam “fé” não é senão um sentimento, e que está sujeito a mutações
tanto quanto qualquer outro sentimento.
Reaparecendo a idosa, e
espero que isso aconteça, quero ver quem vai levar os louros do milagre: a
Virgem Aparecida, os curandeiros ou os adeptos de Xico Xavier, que não jogam no
mesmo time.
A menos que ela tenha fugido
com o sacristão.
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