quarta-feira, 28 de novembro de 2012


O TESTEMUNHO VIVO DE UM MORTO
João Eichbaum

Na noite anterior ao dia de finados, Júlio Miguel Molinas Dias foi assassinado a tiros dentro do seu C4, quando chegava em casa, na rua Professor Ulisses Cabral, no seletivo bairro Chácara das Pedras, em Porto Alegre.
Molinas era coronel reformado do exército, morava sozinho, e estaria voltando da casa de uma das filhas, quando foi morto. Consta que o autor dos disparos fatais teria sido um homem que estava sentado no banco do carona do automóvel dirigido por Molinas.
Então havia mais de uma vertente de hipóteses para se chegar a quem, ao como e ao porquê do crime. Será que o coronel não era viado, tinha contratado um garoto de programa e, sem acerto no preço, a coisa terminou na base do tiro? Será que o coronel gostava de viado, para sair da rotina de sua atividade sexual? Ou teria sido seqüestrado e, ao tentar reagir, teria sido assaltado?
Viúvo, morando sozinho e com um contracheque atraente, é claro que o coronel não podia dispensar mulher também, e estava sujeito às desordens do amor. Então: “cherchez la femme”. A mulher não foi encontrada, mas telefonemas levaram à conclusão de que Molinas havia contratado serviços de detetive particular. Supostamente para apurar se, ou com quem, estava sendo passado para trás. Então, mais uma vertente: tem mulher no meio?
O delegado estava coçando a cabeça, porque com tanta coisa para fazer não tinha tempo de coçar o saco, quando os investigadores lhe puseram em cima da mesa a papelada que haviam encontrado na casa da vítima.
A papelada revelava o passado. O coronel era comandante do DOI-Codi no Rio de Janeiro em 1981, na época em que um artefato explosivo matou um sargento e feriu um capitão no Riocentro, onde se concentravam cerca de vinte mil pessoas para um show de protesto contra o governo militar de então. A Molinas, como comandante, cabia a tarefa de substituir a verdade altissonante de que o atentado tinha sido planejado pelo aparelho repressor do exército, pela mentira oficial de que fora obra da subversão. A farsa ia desde a tentativa de calar para sempre o capitão ferido, ao afastamento de oficial que não compartilhava da mentira. Tudo escrito no diário do coronel, que foi descoberto pela  polícia e depois  estampado na imprensa.
Entre esses papéis também foi encontrado e saudado como troféu um ofício com o timbre do Exército, dando conta de que Rúbens Paiva, um deputado desaparecido sem deixar vestígios de vida ou morte, tinha sido levado para o DOI-Codi.
O Tarso Genro aproveitou o fato para tapar com a peneira o sol que mostra a todos os gaúchos o fracasso do seu governo: organizou um ato solene para entregar uma cópia (um "xerox," como diz o povo) desse ofício à filha do deputado. Com pompa, circunstância e holofotes da imprensa, como se fosse a obra prima de sua administração.
Tudo isso aconteceu graças a um bandido, diga-se de passagem. Que pode até ser um viado
Será que o Tarso Genro vai condecorá-lo?


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