OS VÂNDALOS
João Eichbaum
joaoeichbaum@gmail.com
Os vândalos não são
falhas da cadeia de montagem de Deus, não. Eles são os verdadeiros homens. São
os homens que correspondem às suas origens. Por que são, verdadeiramente,
animais.
O animal homem não é, por
natureza, um animal manso. Como não o são o leão, o tigre, a serpente. O animal
homem foi amansado pelos filósofos, pelas religiões, pelas convenções sociais,
que outra coisa não são senão frutos da filosofia, da religião e das
conveniências de qualquer grupo dominante.
Alguns, talvez maioria,
assimilaram esses ensinamentos, passaram-nos aos filhos, esses passaram-nos
adiante, e assim foi, de geração em geração: são como os elefantes, mansos, que
não sabem a força que têm.
Mas, os poucos que os não
assimilaram, ou simplesmente os recusaram, ou se os assimilaram, tiveram-nos
destruídos pela hipocrisia social, esses voltaram à estaca zero, voltaram a ser
homens em sua natureza pura, a natureza animal, na qual está ínsita a
violência, projeção natural do instinto de sobrevivência. Ou simplesmente
porque gostam de ver Roma pegar fogo.
Quer porque não tenham o
que outros têm, a mulher gostosa e fiel,
a conta no banco, o carro último tipo, o celular idem, a casa com piscina, a
casa na praia, as férias nas ilhas gregas, a chefia na empresa; quer porque não
tenham sido contemplados pela sorte de pertencer ao grupo melhor aquinhoado;
quer porque sua voz não tenha sido ouvida quando bradavam contra
injustiças e desequilíbrios sociais, eles sempre terão mil razões para
se afastarem da turma dos bem educados, dos certinhos, dos que fazem tudo
de acordo com o manual.
Eles sabem que, sozinhos,
não conseguirão nada. Então ficam à espera da ocasião, porque inteligentes,
como os outros da sua espécie, eles são. São ocasiões raras, mas, enfim, podem
acontecer. E digamos que aconteçam, como estão acontecendo agora: os
mauricinhos e as patricinhas, que não têm a mais puta idéia do que seja passar
uma noite na fila do SUS, e que, fazendo bem as contas, ainda não tiveram
motivos para dizer que se deram mal na vida, resolvem protestar, sair com
bandeiras, gritando palavras de ordem, a maioria menos por vontade própria do
que arrastados pelo receio de comprometer sua biografia pela “alienação”.
E aí, os homens no seu
estado puro, aderem. Aderem mais por obediência aos impulsos da natureza,
porque não assimilaram as lições da hipocrisia. Então, eles dão vazão ao que
lhes vai pelo bestunto e saem quebrando, batendo, ferindo, rapinando, pedindo a
bunda de alguém, ao contrário dos outros, que só querem “paz”.
E são chamados de
vândalos, de bestas, e são vaiados, alguns são presos, segregados do convívio
social.
Nesses momentos, nenhum
sociólogo se apresenta. Todos estão do mesmo lado, o lado dos certinhos, dos
cordeiros, o lado dos que obedecem às hipócritas convenções sociais, que não
botam o seu na reta. Ninguém defende os verdadeiros homens, os homens fiéis à sua
natureza, chamados pela linguagem "cult" de vândalos. Ninguém se dá
conta de que essa rejeição torna mais forte a natureza animal que sempre falou
mais alto por eles, os vândalos.
De modo que a história
vai ser sempre assim. A menos que os descendentes de Átila e de Nero vençam no
segundo turno, levando a melhor sobre os descendentes de Jesus Cristo.