QUEM
MENTE MAIS?
João
Eichbaum
Esses seres fascinantes e esquisitos, que são as criaturas humanas, se
deixam seduzir facilmente pelas mentiras: as das religiões, as do futebol, as
da política. Só uma grande mentira poderia explicar, por exemplo, essa evolução
que vai de um estábulo fedendo a pum de burro, em Belém, ao luxo do Vaticano,
em Roma.
Em quem você acredita mais: naquele jogador que ontem beijava a camiseta
do Inter, era o seu herói, e hoje beija a camiseta do Grêmio e é o maior vilão
do planeta? Naquele político que, nos tempos de antigamente, era da Arena e
hoje apóia o PT? Ou naquele que ontem pegava em armas, para lutar pela
democracia e hoje, na democracia, exalta a ditadura de Cuba, da Venezuela, e
chama de golpe o instrumento adotado por uma Constituição democrática para
expulsar maus governantes?
Como mãe da política, a mentira não permite que candidato algum revele
suas verdadeiras intenções. Nem as sujas, nem as limpas. Se o sujeito, num comício,
abrir a boca para dizer que, a fim de sanar as dívidas do Estado, terá que
diminuir o número de funcionários, terá que não só atrasar o pagamento como
congelar o valor dos salários, deu pra ele, tchau, pode se despedir. A mãe da
política não permitirá que sua filha o receba em seu seio, porque o candidato
está comprometido demais com a verdade.
Só se elege o candidato que promete mundos e fundos: que vai aumentar
salários, que vai dar emprego para todo mundo, que todo mundo vai ter saúde,
segurança e educação, e quem não quiser trabalhar não se preocupe, ninguém passará
fome. Se Deus não providenciar, o Estado providenciará, casa, cama, comida,
mulher ou marido, conforme o gosto e o jeito de dar, porque, como disse São
Francisco, é dando que se recebe.
Sendo assim, dominada pela mentira, quem merece menos crédito na política:
o delator ou o delatado? Estará o delator dizendo a verdade, se ele entrega o
parceiro de sacanagem só porque quer alguma coisa em troca? Como poderá o
delatado dizer a verdade, se ele foi criado na escola da mentira?
Para quem sabe que a cúpula do Judiciário é gerada no útero da política,
fica difícil fugir dessa indagação: haverá, neste país, algum togado com
inteligência, argúcia e isenção suficientes para separar o joio do trigo, ou
seja, o mentiroso maior do mentiroso menor, para que a mentira da justiça seja
a menor possível?