VÍCIO DE ESCREVER
João Eichbaum
Só o vício de escrever ou a obediência ao chefe, para não perder o
emprego na atividade profissional, leva alguém a publicar crônicas, hoje em
dia.
O analfabetismo funcional adquiriu tal força, que o pobre cronista já
sabe o que lhe vai acontecer. A crônica vai ser recebida com aplausos por
aqueles que enxergarem nela o reflexo de suas ideias. Mas, ataques furiosos,
nauseabundos adjetivos ou impiedosas críticas atingirão o cronista, partindo de
quem não pensa como ele.
Quer dizer: não é a arte da escrita que seduz o leitor moderno. Não é a
oportunidade para que ele enriqueça seu vocabulário, para que ele conheça novos
estilos, para que o deleite a musicalidade do texto. O leitor quer simplesmente
ouvir o eco de seus pensamentos.
Isso, para falar das poucas pessoas que ainda se entregam à leitura de
textos que não tratem só de abobrinhas. Na realidade, a maioria absoluta da
população brasileira não lê, porque não tem preparo, não tem cultura, não tem o
mínimo interesse em abandonar o marasmo da ignorância.
Para que ler, se a televisão mostra o que interessa: crime, política,
sexo e futebol? Se as novelas da Globo, o Faustão, o Datena e outros desse
naipe dependem apenas de um dedo para aparecer na tela, não há razão alguma
para gastar os olhos em jornais, livros e revistas.
Essa mesma televisão, que serve aos analfabetos propriamente ditos,
também faz a cabeça dos analfabetos funcionais. Aquele homem engravatado e
aquela mulher charmosa e atraente, que leem as notícias, são muito mais
convincentes do que as letras mortas de livros, jornais ou revistas. São eles que
criam as correntes adversas, essas que só aplaudem quem faz eco às suas ideias.
Na contramão do crescimento da população, os jornais vão, aos poucos,
desaparecendo. Editoras e livrarias estão fechando. E a própria televisão já
começa a perder espaço para as redes sociais que, por seu turno, vão destruindo
a linguagem.
Apenas na preparação para os exames vestibulares do ensino público a
literatura tem algum lugar. Mesmo assim, resenhas meticulosamente preparadas
acabam descaracterizando as obras e os autores.
Então, diante desse quadro, só o vício de escrever pode manter a
crônica em algum cantinho de jornal, enquanto houver lugar no museu das coisas
agonizantes.
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