terça-feira, 12 de agosto de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

Crô
É ASSIM, É OU NÃO É?
Paulo Wainberg




Minha relação com elevadores é conflitada há muitos anos. Quando quero subir ele desce, quando quero descer, ele sobe.
Aqui entre nós e que ninguém fique sabendo, tenho conflitos semelhantes, bem mais eventuais, raríssimos, na verdade que me lembre, apenas uma vez e nem foi tanto assim, em outras áreas de minha atividade em que minha vontade de subir não corresponde aos desígnios hidráulicos dos aparelhos competentes...
Et voilá!
Aperto o botão para descer e o elevador que se abre à minha frente sobe. Aguardo pacientemente e quando ele desce... está lotado.
E vice-versa, vice-versa, vice-versa e, por fim, vice-versa.
Nas raríssimas vezes em que chega a frente dele e ele está escancarado, prontinho para mim e com vontade de atender à minha vontade, sinto que daí em diante e para o resto do dia, a sorte me bafeja.
Você sabe que não sou supersticioso embora não me atreva a deixar de passar a mão num poste, ali na esquina, sob pena de ter um azar terrível. Não se pode dizer que isso é uma superstição, não senhor.
Vamos por o fato no arquivo denominado “manias” que, mal ou bem, ocupa boa parte do meu disco rígido a ponto de, algumas vezes, ser chamado a compactá-los para liberar mais espaço disponível.
Dentre as manias que eu tenho uma é gostar de você. E você sabe que é com você que estou falando, não vou revelar seu nome, fique à vontade, você e eu sabemos de quem estou falando. E para não alimentar idéias difusas, conflitos emocionais, crises de ciúmes, ilusões vãs, esperanças inúteis e mal-entendidos de qualquer tipo, espécie, intensidade e fúria, deixo bem claro que “entre as manias que eu tenho uma é gostar de você” é como começa uma música de autoria, se não falha o winchester, de Flávio Cavalcanti, aquele mesmo que quebrava discos ao vivo no seu programa de auditório, no início da segunda metade do século passado.
Não me confunda, originalidade não é o meu forte. Mas tenho uma categoria para copiar os outros que... raros possuem. É um dos meus talentos, o maior deles, talvez.
Voltando aos elevadores, já notou o tempo de vida útil que perdemos a bordo. Assim, por alto, calculo que mais de dez por cento de nossa vida são perdidos subindo, descendo ou esperando pelos cubículos voadores.
Foi depois dessa estatística que desenvolvi algumas técnicas para passar o tempo durante o percurso vertical, principalmente quando ele está lotado, isto é, quase sempre.
A primeira coisa que inventei (e parei quando quiseram me bater) foi tossir tumularmente e depois comentar em voz alta: se meu médico sabe que saí do hospital com este vírus, vai me matar.
Tive sucesso algumas vezes, o pessoal sorriu amarelo, uns perguntaram qual era o vírus, muitos queriam saber como se transmitia, quando a coisa engrossou definitivamente saltei na primeira parada, o que me custou preciosos minutos de espera até conseguir nova vaga, com público diferente.
Quando o elevador está repleto de homens (quase sempre), digo alguma piadinha sem graça do tipo “o ambiente está pesado”, ou “cheiro de homem é horrível” que ninguém acha graça nem responde. Aí eu insisto: “com minha sorte ele vai estragar e vou ficar trancado com vocês. Já pensou?” E nada. Então, uma vez, resolvi ficar quieto e agüentar no osso do peito a varonil companhia. Fiquei indignado quando um baixinho disse: “o ambiente está pesado”.
Quando estou acompanhado de mulheres, me comporto. Silêncio absoluto, olhos postos no marcador de andares e músculos imobilizados, vamos que encoste em alguma sem querer e ela resolva armar um barraco ali dentro.
Ou, o que é pior, que ela corresponda à encostada...
Se o público é misto deixo a coisa ao acaso. Se alguém falar eu falo. Se alguém respirar eu respiro. Se alguém comentar eu comento. Viro Maria Vai com as Outras que, em determinadas circunstâncias, é a melhor coisa que se pode fazer nesta vida.
Uma única vez em toda a minha vida fiquei trancado dentro de um elevador. E eu estava sozinho! E no escuro. E eram sete e meia da noite. No inverno.
Não sou claustrófobo nem quero ser. Simplesmente me encostei numa das paredes do elevador e acendi um cigarro, contra tudo e contra todos.
Poucos minutos depois – que pareceram muitos – ouvi uma voz perguntando se havia alguém preso no elevador. Respondi: Eu! E a voz: Tem mais gente? E eu: Não! E a voz: então agüenta aí que faltou luz e estamos ligando o gerador. E eu: Tudo bem.
Fiquei ali, fumando, lamentando que numa hora daquelas a Renée Zwetzegger ou similar não estivesse comigo, assustadíssima e precisando de um ombro amigo e de uma voz carinhosa a lhe dizer que não tivesse medo, logo logo sairíamos dali e, quem sabe?, para comemorar?, a gente podia tomar alguma coisa e rir bastante do episódio.
Mas essas sortes (ou azares) não pertencem ao meu mapa astral. O máximo que consegui foi sair dali quinze minutos depois, recebido como herói pelo zelador da noite do edifício que estava me esperando, no térreo.
Talvez o poste em que tenho que passar a mão diariamente não esteja funcionando adequadamente.
Não sei.
Minha vida é assim, feita de pequenos sucessos aqui, pequenos fracassos ali, o último deles na semana passada quando a mega sena deu 03-05-07-09-17-32 e eu tinha um bilhete com 01-03-07-09-11-13. Dos dezesseis milhões vi meu premio reduzir-se a setenta reais que mal deu para pagar o almoço de domingo.
Azar? Azar.
Dentro de cinco minutos estarei diante da porta de um elevador, querendo descer. Ele passará por mim, subindo. Descerá lotado. Quando finalmente conseguir adentrá-lo serão sete e quinze e estarei sozinho lá dentro. Faltará luz?
Para encerrar declaro que felizmente sou daqueles que dezesseis milhões não traz felicidade. Infelizmente setenta reais também não.
nicas maniáticas

Nenhum comentário: