quinta-feira, 27 de novembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

A SÍNTESE DA TOLERÂNCIA
Paulo Wainberg

Nome árabe, descendência muçulmana, cristão e negro, Obama é o Presidente dos Estados Unidos. Derrotou os sisudos e morenos republicanos e conquistou os loiros e joviais democratas. E suas bochechas coradas.
Para o mal e para o bem, os Estados Unidos continuam servindo de exemplo para o resto do mundo.
Hipócritas mas não cínicos há pouco mais de cinqüenta anos cultivavam explícita segregação racial e obedeciam fielmente os princípios de sua Constituição, arvorando-se em modelo de democracia e respeito aos direitos humanos.
Jamais impediram os negros de freqüentar escolas, igrejas, estádios, transportes coletivos, bares, restaurantes e qualquer outro local público, desde que respeitassem os locais a eles destinados e não ousassem misturar-se com os brancos.
Verdadeiros heróis como Mohamad Ali, Malcon X e Luther Martin King, em nome da Constituição americana que respeitavam, criaram o que se chamou de uma consciência negra, um perfil de cidadania integral pela qual lutar, com manifestações, atos públicos, movimentos políticos e principalmente palavras, até obter o reconhecimento legal à igualdade civil que, de forma definitiva, aboliu o segregacionismo institucional.
As distorções evidentes, representadas por indecentes sociedades de supremacia racial das quais a Kukluxkan foi expoente (e ainda é), tiveram amparo dissimulado por longas décadas durante as quais, sem nenhuma vergonha na cara, o sistema judiciário americano protegeu os interesses dos brancos, sempre que em conflito com os dos negros.
A extraordinária evolução da sociedade americana (ainda não alcançada pela atavicamente racista Europa) compreendeu a diferença entre racismo e discriminação racial, percebeu que o racismo é um dos piores sentimentos humanos e evoluiu gloriosamente. Como num processo analítico, aceitou-se como racista e determinou-se, não sem dor e sofrimento, a erradicar a sua mais terrível manifestação: a discriminação.
Trata-se, indubitavelmente, de uma consagradora vitória da inteligência sobre o instinto.
Países como o Brasil, que aliam hipocrisia e cinismo, hipocritamente discriminam e cinicamente negam a discriminação. A nossa sociedade multirracial infelizmente recusa-se a diagnosticar a doença e brinca de minimizar o sintoma.
Nenhum exemplo é melhor do que o recém vigente sistema de cotas para ingressos nas Universidades, medida que equivale a dizer que continuamos racistas e discriminadores, mas.... não muito.
Barak Obama pode ser um bom ou mau Presidente. Isto é que se verá brevemente quando poderemos avaliar o indivíduo, suas qualidades, sua competência, seus defeitos e fragilidades.
Porém o Obama eleito Presidente é, para felicidade do planeta Terra, a síntese da tolerância.
Este foi um bom exemplo. Mas os americanos também produzem péssimos exemplos para a Humanidade. Para ilustrar, reproduzo a crônica a seguir, escrita quando GWB resolveu invadir o Iraque:

O FANTÁSTICO DOUTOR BÚ
Paulo Wainberg
Dizem que seu poder surgiu em virtude de uma extraordinária conjunção de fenômenos naturais.
Aos seis anos brincava no seu lugar favorito da fazenda dos pais milionários, no Texas: o poço de esterco.
Era uma tarde comum como tantas outras e ele fazia seus castelos de esterco, lambuzando as mãozinhas, os pezinhos o rostinho e os cabelinhos.
O céu estava claro e sem nuvens quando raio misterioso, surgido ninguém sabe de onde, atingiu o poço, espalhando esterco para todos os lados.
O pequenino recebeu forte carga eletromagnética e o esterco grudou em seu infantil corpo, misturando as respectivas moléculas e provocando uma reação química sem precedentes.
A partir desse dia ele pode espalhar merda para onde quisesse, com um simples arquear das sobrancelhas torneadas, sobre os olhinhos apertados que herdara de seu pai.
O pai que até então desconfiava do menino e, isso não era segredo, tinha uma ponta de antipatia por ele, ao perceber o super-poder recém adquirido vaticinou, comendo arroz com leite na cadeira de balanço na varanda, para a mãe que preparava um bolo de milho no fogão a lenha:
- Este menino, jogando merda pra todo lado, tem tudo para ser Presidente da América.
O vaticínio estava certo e hoje o fantástico doutor Bú – como ficou conhecido na Universidade - espalha merda pelo mundo e não quer nem saber de quem está embaixo.
Uma coisa deve ser dita em seu favor: ele nunca prometeu que seu poder era para o bem nem que sua gestão seria fácil.
Ao contrário. Avisou, com todas as letras e para quem quisesse ouvir, que a coisa ia demorar, seria sangrenta e iria causar muitas mortes.
Documentos secretos há pouco revelados mostram que a coisa foi planejada há muitos anos, quando o jovem Bú, universitário e maconheiro, foi preso por dirigir embriagado.
Sozinho, na cela na qual foi confinado por uma noite, tirou do bolso seu brinquedo favorito: soldadinhos de chumbo. Colocou-os em posição de combate, arqueou as sobrancelhas e estercou tudo, riu e bateu palmas. Adormeceu com sua fantasia preferida: ele, lá do alto, a bordo do avião número um, franzindo as sobrancelhas e espalhando merda sobre a humanidade.
Seu maior sonho é cobrir a América de esterco, coisa que está quase conseguindo, lentamente porque seu super-poder não é tão poderoso para esmerdear tudo de uma só vez.
Enquanto isso, do outro lado do mundo, o execrável doutor Sadú, já defenestrado por seus traidores íntimos, invejoso do super-poder do desafeto, há muito estercara seu país com esterco explícito e berrava aos quatro cantos do mundo que o fantástico doutor Bú não passava de um merdinha.
Como sempre acontece quando dois estercadores entram em choque, quem paga o pato são os outros, os respingados.
Então eu pergunto: como é que se faz para sair de baixo?

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