DA ARTE DE ESCREVER
João Eichbaum
Percival Puggina é a
prova mais concreta, mais viva e palpitante de que, para ser jornalista, não é
necessário diploma: basta saber escrever. Puggina tem o diploma de arquiteto.
Mas se tornou um grande arquiteto das palavras.
Saber escrever. Não. Não é
tão simples assim. Saber escrever não significa apenas respeitar as regras
gramaticais, colocando o verbo no tempo certo, observando as regências e
evitando tropeços nos vícios gramaticais mais abjetos.
Não é a escrita, a frase, a
oração ou o período que qualificam a boa expressão. É a forma como se transmite
o pensamento. Quer dizer: só sabe escrever quem consegue exprimir o pensamento
de forma correta, elegante, fácil e natural.
E Percival Puggina é mestre
nessa arte. Ele escreve sem o hermetismo dos filósofos, sem a janotice dos
literatos, sem a vulgaridade dos levianos e sem a embriaguez dos poetas. Seu
pensamento é denso, sem ser fechado. Seus vocábulos são fáceis, sem serem
triviais. Suas frases são sedutoras, sem serem artificiais.
Nem mesmo o longo espaço que
ele ocupa no jornal, do cabeçalho ao rodapé, certamente por exigência da
diagramação, consegue lhe atrair a pecha de prolixo. Exatamente por isso –
desculpem a repetição – porque ele escreve de forma correta, elegante, fácil e
natural.
A correção da frase é
imposição do respeito pela gramática. A elegância é virtude ditada pela necessidade
de fugir do rasteiro. A facilidade é o caminho que leva com mais rapidez o
pensamento até o leitor. A naturalidade representa o texto despojado de
artifícios destinados especificamente a seduzir a quem o lê.
Tudo o que digo aqui pode
ser aplicado a qualquer escrito do Percival Puggina. Mas ele é um escritor tão
perfeito que consegue o milagre de superar a si mesmo. Como, por exemplo, em
sua crônica na ZH de ontem, “Notas do cárcere”.
Sem qualquer compromisso com
a parcimônia, abordando o assunto do crescimento da criminalidade, eu diria,
matando jacaré a botinadas: o Estado, com os impostos que nos arranca, sob
ameaça de confisco, pratica uma desordem pior do que a de bêbados brigando em
puteiro. Com isso facilita a organização
do crime.
Percival Puggina, não. Com
elegância e estilo ele atribui, com propriedade, à inoperância do Estado -
Legislativo, Executivo e Judiciário - o poder crescente da criminalidade. E retrata
fielmente o drama vivido pelos cidadãos de bem, da tortura íntima de quem sofre
o ataque, ao desencanto público de quem lê as manchetes. Tudo com a serenidade
de quem domina as palavras, usando-as como instrumento de expressão do
pensamento.
É uma pena que talentos como
o de Percival Puggina sejam subjugados pela ganância dos que só querem
dinheiro, fama e poder. Com um Percival Puggina em cada jornal, este país seria
outra coisa.
Um comentário:
Puggina
Este artigo sobre a qualidade dos escritos de Percival Puggina veio dar forma ao que eu intuía ao ler admirar seus comentários. O escritor em tela não precisou cursar jornalismo ou letras para chegar a uma redação cujas virtudes Eichbaum destaca. Percival pensa e escreve com clareza, sem precisar ser rebuscado. Totalmente diverso daquela linguagem empolada que se vê nos arrazoados de alguns ministros do Supremo e é destacado na última página da Veja que está nas bancas. Parabéns ao bloguista por reconhecer os méritos de quem tem.
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