João Eichbaum
joaoeichbaum@gmail.com
Pegou mal, muito mal, a
decisão do Tribunal de Justiça, libertando, no meio das almas destroçadas pela
dor, os réus do processo da boate Kiss. Carradas de argumentos jurídicos tinham
os desembargadores para fazê-lo. Ditado pela sensatez, porém, o momento não era
aquele.
Justiça se faz com lei,
certo. Mas sem bom senso, não.
Tal foi o impacto
negativo da decisão, que desarvorou até o Ministério Público. Seus
agentes que, por compreensíveis razões humanas, vestiram a camiseta da
acusação, tomando-a como sinônimo de "justiça", não puderam fugir ao
desencanto. E se entregaram à obra, nada
acadêmica, do direito de espernear.
Ocorre que, do “habeas
corpus” concedido pelos tribunais locais, não cabe recurso. O artigo 105,
inciso II, letra “a” da Constituição Federal só permite o recurso ordinário,
quando o “habeas corpus” for desfavorável ao réu.
É claro que o
Ministério Público sabia disso. Sabia que não poderia recorrer. Sabia que não
tinha argumentos para derrubar a medida. Mas, estava subjugado pelo impacto
negativo que a decisão causara, reacendendo o clima de revolta entre os que
ainda choram os seus mortos.
Mas, sobretudo sabia o
Ministério Público que estava sujeito às críticas dos juristas, aos comentários
menos lisonjeiros daqueles que, conhecendo o direito, não permitem agressões ao
ordenamento jurídico brasileiro, mormente quando se trata de matéria penal.
Mesmo sabendo de tudo
isso, mesmo sabendo que poderia até ser ridicularizado, como o sujeito que vai
procurar virgem na zona, o Ministério Público enfrentou os desafios, pôs de
lado os escrúpulos, e se entregou às feras.
Sem argumentos
jurídicos, já que sua pretensão corria na contramão da própria Constituição
Federal, se socorreu de argumentos sociais, lançou mão de razões desconhecidas
do direito processual penal, para buscar a manutenção dos réus no cárcere,
sustentando, entre outras coisas, que “o caso despertou comoção nacional, repercussão
internacional e desassossego na população local”. Mas, descarrilhado da
trilha legal, não teve êxito.
Agora, depois de todo
esse esforço, depois de ter passado, inclusive, pelo vexame de haver batido em
portas de tribunal errado, o Ministério Público, ao invés de ser aplaudido,
virou alvo de apedrejamento moral, se tornou a “Geni” dos descontentes. E isso
pela pura e simples razão de ter retomado seu verdadeiro papel na cena
processual, que é a busca da justiça através do direito e não do sentimento.
Na ação de improbidade
administrativa, atrelada escrupulosamente aos critérios legais, a instituição
pediu apenas a citação de bombeiros. Com isso, perdeu o lugar que, no pódio do
heroísmo, lhe haviam reservado aqueles que parecem sucumbir a um único desejo,
certamente portador de conforto e recobramento da alma ou, quem sabe, da
salvação eterna: a morte política do prefeito e de seus secretários. E até uma
freira, amiga do Tarso Genro, que não foi comida por ninguém e por isso se acha
sem pecado, aplicou o ensinamento evangélico do “atire a primeira pedra”.
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