quarta-feira, 24 de julho de 2013

A VIDRAÇA DO MINISTÉRIO PÚBLICO


João Eichbaum
joaoeichbaum@gmail.com


Pegou mal, muito mal, a decisão do Tribunal de Justiça, libertando, no meio das almas destroçadas pela dor, os réus do processo da boate Kiss. Carradas de argumentos jurídicos tinham os desembargadores para fazê-lo. Ditado pela sensatez, porém, o momento não era aquele.
Justiça se faz com lei, certo. Mas sem bom senso, não.
Tal foi o impacto negativo da decisão, que desarvorou até o Ministério Público.  Seus agentes que, por compreensíveis razões humanas, vestiram a camiseta da acusação, tomando-a como sinônimo de "justiça", não puderam fugir ao desencanto. E se entregaram  à obra, nada acadêmica, do direito de espernear.
Ocorre que, do “habeas corpus” concedido pelos tribunais locais, não cabe recurso. O artigo 105, inciso II, letra “a” da Constituição Federal só permite o recurso ordinário, quando o “habeas corpus” for desfavorável ao réu.
É claro que o Ministério Público sabia disso. Sabia que não poderia recorrer. Sabia que não tinha argumentos para derrubar a medida. Mas, estava subjugado pelo impacto negativo que a decisão causara, reacendendo o clima de revolta entre os que ainda choram os seus mortos.
Mas, sobretudo sabia o Ministério Público que estava sujeito às críticas dos juristas, aos comentários menos lisonjeiros daqueles que, conhecendo o direito, não permitem agressões ao ordenamento jurídico brasileiro, mormente quando se trata de matéria penal.
Mesmo sabendo de tudo isso, mesmo sabendo que poderia até ser ridicularizado, como o sujeito que vai procurar virgem na zona, o Ministério Público enfrentou os desafios, pôs de lado os escrúpulos, e se entregou às feras.
Sem argumentos jurídicos, já que sua pretensão corria na contramão da própria Constituição Federal, se socorreu de argumentos sociais, lançou mão de razões desconhecidas do direito processual penal, para buscar a manutenção dos réus no cárcere, sustentando, entre outras coisas, que “o caso despertou comoção nacional, repercussão internacional e desassossego na população local”. Mas, descarrilhado da trilha legal, não teve êxito.
Agora, depois de todo esse esforço, depois de ter passado, inclusive, pelo vexame de haver batido em portas de tribunal errado, o Ministério Público, ao invés de ser aplaudido, virou alvo de apedrejamento moral, se tornou a “Geni” dos descontentes. E isso pela pura e simples razão de ter retomado seu verdadeiro papel na cena processual, que é a busca da justiça através do direito e não do sentimento.
Na ação de improbidade administrativa, atrelada escrupulosamente aos critérios legais, a instituição pediu apenas a citação de bombeiros. Com isso, perdeu o lugar que, no pódio do heroísmo, lhe haviam reservado aqueles que parecem sucumbir a um único desejo, certamente portador de conforto e recobramento da alma ou, quem sabe, da salvação eterna: a morte política do prefeito e de seus secretários. E até uma freira, amiga do Tarso Genro, que não foi comida por ninguém e por isso se acha sem pecado, aplicou o ensinamento evangélico do “atire a primeira pedra”.




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