VARA DE FAMÍLIA
João Eichbaum
Favorecido até pela
Constituição, o puxa-saquismo é uma instituição nacional. Dentro e fora dos
órgãos públicos ele é a máquina que propulsiona interesses pessoais e engorda
vaidades. Segue o exemplo.
A Constituição Federal
defere aos “órgãos de representação da classe” dos advogados a composição de
lista sêxtupla, arrolando bacharéis “de
notório saber jurídico e ilibada conduta”, candidatos à toga de desembargador
ou ministro.
Esqueça os requisitos
do “saber” e da “conduta”, porque os ingredientes pessoais que contam são
outros: a vaidade, ou a necessidade de emprego. Ninguém “de notório saber
jurídico” fecharia sua banca famosa e rendosa em troca de serviço público,
senão por vaidade. Mas, há casos em que advogados trocam sem pestanejar seu
escritório meia boca por uma toga de ministro ou desembargador.
Há também os
expertinhos, claro. Eles têm banca famosa e rendosa, composta por membros da
família e amigos do peito e por isso não fecham o escritório, mas o entregam
aos filhos e aos amigos, para que continuem o negócio. Depois de cinco anos
eles têm clientela garantida, além dos belos trocadinhos de aposentadoria de
desembargador ou ministro. Sem contar a influência do “nome do pai” em alguns
togados, fracos de carne e de espírito também.
É claro que, na lista
dos Conselhos da OAB, o que conta, em primeiro lugar, é a amizade: se você pode
escolher para desembargador ou ministro um amigo, mesmo que ele não seja grande
coisa no Direito, por que vai escolher um inimigo inteligente? O amigo o
receberá debaixo da toga de desembargador ou de ministro e não ficará
indiferente às petições que você lhe fizer ao pé do ouvido. Pode até rolar
beijinho no ombro. Mas nada ganhará você, se escolher um inimigo, ou um conhecido,
que às vezes o cumprimenta, outras vezes não, ou algum bacharel que já o
sacaneou numa causa.
Então, vamos ao que
realmente lhe interessa. Se você for conselheiro da OAB, não lhe agradará
ver, com toga de ministro ou desembargador, quem não vai com sua cara, ou quem,
com certeza, nunca lhe dará uma mãozinha, mesmo que você lhe diga que a toga
lhe cai bem ou combina com a cor do cabelo (implantado) dele.
Partindo desse
pressuposto, agora o Brasil inteiro está capacitado a entender por qual razão a
menina Letícia Melo, quimicamente loira, foi escolhida como desembargadora do
Tribunal Regional Federal da 2ª Região: é filha da desembargadora do Tribunal
de Justiça do Distrito Federal Sandra de Santis Mendes de Farias Melo e de seu
consorte - e bota sorte nisso - o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco
Aurélio Melo, primo do Presidente da República que o nomeou, Fernando Collor de
Melo.
O puxa-saquismo serviu
de alicerce para que a menina, ops, a desembargadora conseguisse o emprego de
que precisava. O pai, Marco Aurélio, a mãe Sandra, e a filha Letícia: graças ao
conselho da OAB do Rio de Janeiro, o Judiciário se transformou numa grande Vara
de Família.
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