A JUSTIÇA E SEUS ESPETÁCULOS
João Eichbaum
A Justiça anda mal nas
paradas de sucesso. Antes de terem reivindicado um canal de televisão para
exibir seus dotes intelectuais, seus implantes, seus cabelos pintados e suas
sobrancelhas desenhadas, os ministros do Supremo Tribunal Federal eram tidos
como provectos e circunspectos senhores. Tanto para a plebe ignara como para os
doutores, eles exsudavam sabedoria debaixo da toga, como donos da palavra
definitiva e indiscutível, tipo bula papal.
Mas, quando começaram a
mostrar ao vivo e a cores a montagem dessa dispendiosa peça de ficção chamada
Justiça, a suposta grandeza do ato de julgar foi desnudada e exibida como um
ato banal, não muito diferente de um bate-boca de vizinhos exaltados.
Dias atrás, suas
excelências estavam gastando seu notório saber jurídico em cima de quatro
galinhas, por conta de uma teoria denominada “de minimis non curat pretor”.
Enquanto isso, debaixo de alguma toga, um processo contra o Collor de Mello,
chocava uma coisa chamada “prescrição” - que só beneficia ricos.
Aproveitando o cenário
montado pela própria justiça e com o nosso dinheiro, o doutor “honoris causa”
Luiz Inácio Lula da Silva, em Lisboa, abriu aquele bocão já ornado por novos
bigodes, para escrachar a sabedoria dos ministros. “O julgamento do mensalão -
disse ele - foi oitenta por cento político e vinte por cento jurídico”.
Em Torres, uma mulher
não teve o direito de espernear para ganhar um filho: a Justiça mandou lhe
passar o bisturi na barriga.
Em Três Passos um
menino de doze anos foi procurar a promotora de Justiça, pedindo colocação em
outra família. Queixou-se do abandono e da incúria paterna. Ao invés de
providências práticas, imediatas, ao alcance de simples telefonema, foi
instaurado um “procedimento”. A força da burocracia levou o pai ao foro, onde o
juiz lhe assinou o prazo de 90 dias para melhorar seu relacionamento com o
filho: isto é, fazer em 90 dias o que não tinha feito em 12 anos. Nesse
interregno, a madrasta matou o menino. Semana passada se armou um comício de
togados para prestar solidariedade ao juiz, cuja atuação no caso estava sendo
questionada pelo deputado ouvidor da Assembleia Legislativa gaúcha. O comício
que, ao que parece, pretendia botar a humanidade no seu devido lugar, teve
muito mais de político do que de emocional. Vários juízes deixaram suas
comarcas para comparecer ao evento, provando que o escritor e advogado Ricardo
Giuliani tem razão: “o Poder Judiciário não existe para a sociedade, mas para
si mesmo”.
E enquanto o Judiciário
organizava seus protestos, se envolvia com galinhas e com a absolvição do Collor, e
alguns togados até gastavam seu latim para contestar o Lula, em Guarujá, São
Paulo, se perpetrava infame “justiçamento” na via pública. Acusada de
sequestrar crianças, uma pobre mulher que voltava da casa de um parente, onde
havia ido buscar uma bíblia, foi amarrada, arrastada e espancada por uma turba
histérica. Vítima da falência e das falácias do Estado, morreu agarrada na
bíblia, mas longe da complacência de Deus. Não sei se teve tempo de chorar.
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