O DEDO DA LEI
João Eichbaum
Ao invés de levantar o
dedo médio, como faz o pessoal que xinga no trânsito, o José Dirceu preferiu
erguer o braço com o punho cerrado, momentos antes de entrar na cadeia para
onde o havia mandado o Joaquim Benedito Barbosa.
Não fez o gesto por primeiro
mencionado, porque corria o risco de mandar, junto com os desocupados que o
aplaudiam e os que só queriam ver a cara dele e a imprensa toda, enfiar o
ressaltado dedo exatamente naquele lugar que vocês estão imaginando. Ah, sim, e
corria o risco de lhes parecer deslumbrado com o que poderiam fazer lá dentro aqueles
presos mal encarados, sujos e malvados, estremecidos pelos suspiros sísmicos de
quem nunca recebeu visita íntima. E outra: isso é um acontecimento comum. Todo
mundo está sujeito a ter o dedo médio cientificamente introduzido no vale das
nádegas ou em outra reentrância menos insolente. Para isso existem
proctologistas, urologistas e ginecologistas.
E tem mais, o punho
cerrado, erguido no ar significa indignação, revolta, luta, excitação. E dói
mais do que um só dedo em riste, ainda que seja o maior de todos, se for usado
para aquela finalidade, de que não tratam os livros de medicina. O Barbosa,
enfim, que entendesse o que bem quisesse.
Agora vem o segundo
capítulo. Beneficiado com os votos do Roberto Barroso e do Teori Zavasky, que
desmantelaram a quadrilha, o Zé Dirceu ganhou regime prisional semi-aberto. E
logo arrumou emprego num hotel, onde iria ganhar uma grana de fazer inveja a
quem trabalha de verdade. Mas, era um emprego bichado por falcatruas do falso
dono do hotel e foi pro brejo.
Surgiu nas últimas
semanas outro emprego, num escritório de advocacia. Dessa vez foi negado porque
a oferta de emprego tinha sido uma “complacência de amigos” e porque José
Dirceu tinha que completar um sexto da pena, antes de pegar no pesado fora da
cadeia.
Aí estourou uma espécie
de escândalo jurídico. Togados de todas as partes e de todos os credos
debitaram a Joaquim Barbosa a quebra da jurisprudência dominante, segundo a
qual, o condenado a regime semi-aberto não necessita desse requisito, para
fazer jus a trabalho externo.
Até o advogado que
prometera o emprego veio a público, posando de gente finíssima, que equilibra a
vida com compensações. Disse que prestara serviços para o Barbosa, sem lhe
cobrar honorários. Queria, de certo, aquela generosidade cristã do “é dando que
se recebe”.
Para quem não sabe: o
regime semi- aberto é aquele cumprido em colônia penal, agrícola ou industrial,
ou estabelecimento similar. Mas a jurisprudência benevolente, mãe dos bandidos,
permite a substituição da colônia pelo
trabalho externo. Aí, livres, eles retomam a violência, cumprindo ordens
emanadas dos presídios. Quer dizer, condenada a um regime sem segurança é a
sociedade.
O ministro Joaquim Barbosa apenas endireitou o
pensamento torto dos juízos anteriores: ao invés do braço ou do dedo médio,
usou o artigo 112 da Lei das Execuções Penais, sem o lubrificante da
jurisprudência.
Nenhum comentário:
Postar um comentário