A
LITERATICE INÚTIL NO DISCURSO JURÍDICO
João
Eichbaum
Depois de gastar 11 laudas, relatando o pedido do
Procurador Geral e as alegações da defesa, Teori Zavaski começou assim seu
sinuoso discurso, convencionalmente chamado decisão, para afastar Eduardo Cunha
das atividades parlamentares:
“O deferimento
de medidas cautelares, no processo penal, pressupõe escrutínio que não se
confunde com o juízo de culpa. Embora também atraia uma avaliação a respeito da
conduta das pessoas de interesse das investigações, o exame cautelar não
comporta nem a mesma profundidade, nem os mesmos parâmetros, nem a mesma
finalidade de um veredicto de condenação”.
Trata-se de explicações desnecessárias sobre o “modus
judicandi” das medidas cautelares penais. Mas
a composição da sentença, essencialmente técnica, dispensa lições desse
gênero. Processo não é cátedra de magistério. O supérfluo em nada contribui
para a formação de um juízo. Teori Zavaski, pela idade que tem, já devia ter
aprendido isso.
Dissequemos o gongórico texto. “Pressupõe escrutínio”.
Escrutínio? Ora, ora. A linguagem de uso corrente e a própria linguagem
jurídica empregam o vocábulo “escrutínio” como sinônimo de sufrágio, apuração
de votos. Só os dicionários lhe emprestam também o sentido de “exame minucioso,
investigação”.
O “escrutínio” do deferimento “das medidas cautelares,
no processo penal...”não se confunde com o juízo de culpa”. Mas, como assim? A
culpa pelos fatos que autorizam a medida cautelar penal é irrelevante? Não há
diferença entre culpado e inocente? Ambos são passíveis de ônus penais,
independentemente de culpa?
A contradição é imperdoável. O ministro desperdiçou um
tempo, que não é dele, mas da função que exerce. Debruçou-se sobre 62 laudas,
para “deferir” medida cautelar penal, sem examinar a culpa de Eduardo Cunha em
relação aos fatos que desencadearam o pedido liminar do Ministério Público?
Teori quis dizer o seguinte: a medida cautelar e a
sentença de mérito exigem raciocínios distintos. Quis dizer isso, mas não
conseguiu, porque sua preocupação maior foi a de ornar sua redação com um
estilo pomposo, empolado, próprio do linguajar dos deuses, que acabou sinuoso
como o caminho de uma centopeia.
Não é necessário passar da primeira frase para
desnudar vícios de forma que contaminam todo o texto. A prolixidade e o enxerto
de palavras catadas no dicionário estão mais perto da artificialidade do que da
certeza científica do Direito. A premissa maior que, no caso, é o princípio
fundamental inscrito no art. 2º da Constituição Federal, ficou perdida na
ambiguidade. Resultado: desatou-se a insegurança jurídica e a lei, neste país, passou a valer menos do
que as ordens de uma dona de cabaré. Que o diga o deputado Maranhão.
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