Não
comento. Aqui já se discutiu muito a retirada do crucifixo de sala de
audiências, onde Juizes não querem o crucifixo. Debates, programas de rádios,
paixões, discutir futebol, religião e mulher nunca dá certo. O melhor é curtir.
Total todos gostam. Cada um a seu modo. Tem até homem que não gosta de mulher.
Como tem mulher que não gosta de homem. E daí. Nem por isso vamos mandar embora
e sair da sala os homens e as mulheres diferentres. Só homossexuais fica muito
chato. Só lésbicas fica cansativo. Há que ter um equilibio, entre lésbicas e
travestís. Metade por metade para se atingir um equilibiro e ter o sabor
da conquista e o mundo ter graça.
.
Eu
quando criança, vivi uma situação curiosa e que não entendia. Na minha
querida Antonio Prado, quando cursei o primário no colégio dos irmãos maristas,
Colégio Sagrado Coração de Jesus. De 1946 a 1950. Só fui entender,
agora que fiquei grande, não em tamanho, nem em cultura, mas, sim, em idade
(72) anos, gordura e 95 quilos e, portanto, muita banha sobrante. mas ainda
estou lúcido. Pelo que se nota não há tubos entupidos e o oxigênio ainda
circula para o meu cérebro. O que já é uma graça de Deus. Estou no
caminho da caduquice ( dos pobres) e do alzheimer, ( para os
ricos) - pois até na classificação deste final trágico há
diferença social no Brasilsão profundo. Mas graças a Deus ainda não
fui atingido. Há sinais. Evidentes.Eu sinto. Estou na reta. No famoso
brete da escuridão. No túnel da bobeira.
Minha
mãe dizia que a coisa mais triste do mundo é a velhice. E se a velhice for com
doença bem aí melhor é morrer antes, pois não perturba, não encomoda os
familiares, não gasta tudo com hospital, médico e farmácia e agora com
esta invenção notável de a familia se libertar do peso do velho caduco ou
alzheimer - a casa geriátrica - o depósito de velho. Que coisa mais
triste. Um depósito de velhos se parece com aquelas fábricas abandonadas
dos bairros industriais decadentes das velhas indústrias ultrapassadas.
Vidros quebrados. O teto desabou. A capoeira tomando conta. A cerca
e o muro cairam. Os mendigos fazem moradia e seu foguinho para se esquentar.
Vandalizaram a outrora pujante fábrica, que tinha vida e cheia de pessoas
trabalhando e produzindo. Virou tapera.
E
o que acontece com a pessoa que entra na fase de usar fraldão
geriátrico. Eis que não controla mais o esfincter anal e da urina. E uma
desgraça e uma decadência total. Por isso, sou favorável ao Clube
da Agulha. Descrevo e procuro viver o resto que me sobra antes de entrar no
mundo obscuro e desconhecido do alemão Alois Alzheimer. De quem de lá nunca
ninguém voltou.
Mas
estamos falando de crucifixo na sala. No tempo da Ditadura do Getúlio
Vargas, de 10.11.1937 ( Estado Novo) até 29.10.1945 ( data da queda do
fazendeiro de São Bora, do Itú) era obrigatóiro manter em todas as repartições
públicas, nas salas de aula, etc. a foto do
"pai dos pobres", do Dr. Getúlio Vargas. As
fotos continuaram no governo que o sucedeu do General Eurico Gaspar
Dutra, eleito em 2.12.1945 ao derrotar o Brigadeiro Eduardo Gomes.
Pois
bem, nas salas de aula do colégio dos Maristas, em Antonio Prado, sobre a
cabeça do professor marista, o regente, dependurado na parede, lá estava a
foto, grande, oficial, obrigatória, do Presidente da República, Getúlio
Vargas, que foi ficando. No governo Dutra. Como o Getúlio
apoiou o Dutra contra o Brigadeiro, então, a foto foi ficando. Ninguém
teve coragem de tirar a foto do "pai dos pobres". E ainda
mais após o governo Dutra, em 3.10.1950, na campanha "Ele voltará" -
o próprio Getúlio Vargas se candidatou e derrotou novamente o Brigadeiro
Eduardo Gomes. Não terminou o mandato, pois, em 24.8.1954, cumpriu o que já
ameaçara várias vezes, se matou com um tiro no peito no Palacio do Catete,
naquele quarto sombrio, gélido, onde morava sozinho, pois, separado da esposa,
dona Darcy Sarmanho Vargas e tinha como amante a corista do teatro rebolado e
de revista a famosa Virginia Lane, ainda viva. ( vive numa geriátrica da
Barra da Tijuca, pobre e abandonada, mas lúcida)
Portanto,
eu passei todo o meu curso primário em todas as salas de aula dos
maristas tendo que olhar aquela foto daquele senhor, já meio idoso, que
ficava olhando para nós, pequenos alunos, com ár de corregedor e de
disciplinador. Lá estava a foto famosa grudada na parede a causar um certo
temor na gurisada, sobre a cabeça do brabo e violento irmão marista, regente,
dando aula. Sabe lá o que é isso. Uma criança no curso primário ter
que ficar olhando durante o período de aula, nos cinco anos, do primário aquela
foto, bem maior do que o crucifixo. Mas, afinal quem era aquele homem,
superior, imponente, que pousava sobranceiro na parede nos olhando com olhar
inquisitório.?
Quando
o regente ensinava História do Brasil então nós tinha que decorar os
presidentes da República. Mal. Deodoro da Fonseca. Mal. Floriano Peixoto,
Prudente de Morais, Rodrigues Alves ate´chegar no homem da foto, Getúlio Vargas
que era o presidente atual. Cujas fotos perduraram no governo adesista ao
getulismo e ao queremismo (queremos Getúlio de
volta) do General Dutra. Aí a turma ficava sabendo que
aquela foto era a do Presidente. A pergunta que nos assaltava logo - e a
foto dos outros presidentes? Por quê só a foto do Getúlio?...
Entendia
em casa e vivia minha dúvida total infantil e que me traumatizava. Meu pai,
Horacio Letti, era do Brigadeiro Eduardo Gomes. Tinha feito campanha cerrada
pelo Brigadeiro Eduardo Gomes, junto com aqueles homens de Antonio
Prado. O lema da campanha do Brigadeiro - era -
" O preço da liberdade é a eterna vigilância"
- dando uma alfinetada na ditadura do Getúlio após o Estado Novo de
1937. Cuja Constituição foi feita e redigida rapidamente pelo notável
Francisco Campos, chamado de "Chico Ciência".
Meu
pai dizia - a desgraça do Brasil é o Getúlio Vargas. Meu ´pai tinha horror ao
Getúliio. Meu pai era do Partido Libertador, do PL. Até hoje não sei dos
motivos que levaram meu pai a ter tanto ódio do Getúlio. O Getúlio tinha o
poder. A chave do cofre. Era ditador. Quem era amigo do Getúlio tudo conseguia.
Emprego. Obras Públicas. Tudo. O Getúlio era um homem bom. Mas, meu pai
era contra.
Meu
pai era do Brigadeiro Eduardo Gomes - o solteirão mais bonito do Brasil -
o partido de todas as mulheres. Elegante. Fino. Educado. Bem fardado. Alinhado.
( alguns achavam até que ele era homossexual, os contra, lógico, os do PTB do
Getúlio insinuavam que o cara era a bicha).
O
irmão marista quando ficava brabo comigo na aula, gritava , ameaçava me
bater, mostrava a régua, um metro de madeira de medir fazenda nas lojas, e
dizia - " ainda por cima, teu pai é um herége, não é católico,
não confessa, não comunga, não vai à missa, não frequenta a Igreja"
- bem aí, eu estava ralado - e ficava de castigo, na parede, de frente para a
parede, de braços cruzados, lá na frente, de costas para a turma, sob a
foto do Getúlio, até bater a sineta para o recreio.
E
assim se passou minha infância em Antonio Prado. A foto do Getúlio na parede
das salas de aula do colégio dos Maristas. E meu pai, em casa, tomando
vinho, no almoço, e dando discurso contra o Getúlio. Que paradoxo. Na aula
venerado. Em casa execrado.
Bota confusão nisso na cabeça da criança.
Este
ensinamento me serviu na vida de Juiz para tratar igualmente a todos, na
medida de sua desigualdade, e me serve até hoje que me esforcei
para criar os tres flhos e agora ajudar na criação dos cinco netos.
Nério
"dei Mondadori" Letti.