segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

HISTÓRIAS QUE O NÉRIO CONTA


Não comento. Aqui já se discutiu muito a retirada do crucifixo de sala de audiências, onde Juizes não querem o crucifixo. Debates, programas de rádios, paixões, discutir futebol, religião e mulher nunca dá certo. O melhor é curtir. Total todos gostam. Cada um a seu modo. Tem até homem que não gosta de mulher. Como tem mulher que não gosta de homem. E daí. Nem por isso vamos mandar embora e sair da sala os homens e as mulheres diferentres. Só homossexuais fica muito chato. Só lésbicas fica cansativo. Há que ter um equilibio, entre lésbicas e travestís. Metade por metade para se atingir um equilibiro e ter  o sabor da conquista e o mundo ter graça.
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Eu quando criança, vivi uma situação  curiosa e que não entendia. Na minha querida Antonio Prado, quando cursei o primário no colégio dos irmãos maristas, Colégio Sagrado Coração de Jesus. De 1946 a 1950.  Só fui entender, agora que fiquei grande, não em tamanho, nem em cultura, mas, sim, em idade (72) anos, gordura e 95 quilos e, portanto, muita banha sobrante. mas ainda estou lúcido. Pelo que se nota não há tubos entupidos e o oxigênio ainda circula para o meu cérebro. O que já é uma graça de Deus.  Estou no caminho da caduquice  ( dos pobres)   e do alzheimer, ( para os ricos)  -  pois até na classificação deste final trágico há diferença social no Brasilsão profundo.  Mas graças a Deus ainda não fui atingido. Há sinais. Evidentes.Eu sinto. Estou na  reta. No famoso brete da escuridão. No túnel da bobeira.

 Minha mãe dizia que a coisa mais triste do mundo é a velhice. E se a velhice for com doença bem aí melhor é morrer antes, pois não perturba,  não encomoda os familiares, não gasta tudo com hospital, médico e farmácia  e agora com esta invenção notável de a familia se libertar do peso do velho caduco ou alzheimer - a casa geriátrica - o depósito de velho. Que coisa mais triste.  Um depósito de velhos se parece com aquelas fábricas abandonadas dos bairros industriais decadentes das velhas indústrias ultrapassadas. Vidros quebrados. O teto  desabou.  A capoeira tomando conta. A cerca e o muro cairam. Os mendigos fazem moradia e seu foguinho para se esquentar. Vandalizaram a outrora pujante fábrica, que tinha vida e cheia de pessoas trabalhando e produzindo. Virou tapera.


 E o que acontece com a pessoa que entra na fase de  usar fraldão  geriátrico. Eis que não controla mais o esfincter anal e da urina. E uma desgraça e  uma decadência total.  Por isso, sou favorável ao Clube da Agulha. Descrevo e procuro viver o resto que me sobra antes de entrar no mundo obscuro e desconhecido do alemão Alois Alzheimer. De quem de lá nunca ninguém voltou.

Mas estamos falando de crucifixo na sala. No tempo da Ditadura do Getúlio Vargas, de 10.11.1937 ( Estado Novo) até 29.10.1945 ( data da queda do fazendeiro de São Bora, do Itú) era obrigatóiro manter em todas as repartições públicas, nas salas de aula, etc.  a foto do     "pai dos pobres",    do Dr. Getúlio Vargas. As fotos continuaram no governo que o sucedeu do General Eurico Gaspar Dutra, eleito em 2.12.1945  ao derrotar o Brigadeiro Eduardo Gomes.

Pois bem,  nas salas de aula do colégio dos Maristas, em Antonio Prado, sobre a cabeça do professor marista, o regente, dependurado na parede, lá estava a foto, grande, oficial, obrigatória, do Presidente da República, Getúlio Vargas, que foi ficando. No governo Dutra. Como  o   Getúlio apoiou o Dutra contra o Brigadeiro, então, a foto foi ficando. Ninguém teve coragem de tirar a foto  do  "pai dos pobres". E ainda mais após o governo Dutra, em 3.10.1950, na campanha "Ele voltará" - o próprio Getúlio Vargas se candidatou  e derrotou novamente o Brigadeiro Eduardo Gomes. Não terminou o mandato, pois, em 24.8.1954, cumpriu o que já ameaçara várias vezes, se matou com um tiro no peito no Palacio do Catete, naquele quarto sombrio, gélido, onde morava sozinho, pois, separado da esposa, dona Darcy Sarmanho Vargas e tinha como amante a corista do teatro rebolado e de revista a famosa Virginia Lane, ainda viva.  ( vive numa geriátrica da Barra da Tijuca, pobre e abandonada, mas lúcida)

Portanto, eu passei todo o meu curso primário em todas as salas de aula dos  maristas tendo que olhar aquela foto daquele senhor, já meio idoso, que ficava olhando para nós, pequenos alunos, com ár de corregedor e de disciplinador. Lá estava a foto famosa grudada na parede a causar um certo temor na gurisada, sobre a cabeça do brabo e violento irmão marista, regente, dando aula. Sabe lá o que é isso.   Uma criança no curso primário ter que ficar olhando durante o período de aula, nos cinco anos, do primário aquela foto, bem maior  do que o crucifixo. Mas, afinal quem era aquele homem, superior, imponente, que pousava sobranceiro na parede nos olhando com olhar inquisitório.?

Quando o regente ensinava História do Brasil então nós tinha que decorar os presidentes da República. Mal. Deodoro da Fonseca. Mal. Floriano Peixoto, Prudente de Morais, Rodrigues Alves ate´chegar no homem da foto, Getúlio Vargas que era o presidente atual. Cujas fotos perduraram no governo adesista ao getulismo e ao queremismo     (queremos Getúlio de volta)     do General Dutra. Aí a turma ficava sabendo que aquela foto era a do Presidente. A pergunta que nos assaltava logo -  e a foto dos outros presidentes?  Por quê só a foto do Getúlio?...

Entendia em casa e vivia minha dúvida total infantil e que me traumatizava. Meu pai, Horacio Letti, era do Brigadeiro Eduardo Gomes. Tinha feito campanha cerrada pelo Brigadeiro  Eduardo Gomes, junto com aqueles homens de Antonio Prado.  O lema da campanha do Brigadeiro - era   -  " O preço da liberdade é a eterna vigilância"   -   dando uma alfinetada na ditadura do Getúlio após o Estado Novo de 1937. Cuja Constituição foi feita e redigida rapidamente pelo notável Francisco Campos, chamado de "Chico Ciência".

Meu pai dizia - a desgraça do Brasil é o Getúlio Vargas. Meu ´pai tinha horror ao Getúliio. Meu pai era do Partido Libertador, do PL. Até hoje não sei dos motivos que levaram meu pai a ter tanto ódio do Getúlio. O Getúlio tinha o poder. A chave do cofre. Era ditador. Quem era amigo do Getúlio tudo conseguia. Emprego. Obras Públicas. Tudo. O Getúlio era  um homem bom. Mas, meu pai era contra.

Meu pai era do Brigadeiro Eduardo Gomes  - o solteirão mais bonito do Brasil - o partido de todas as mulheres. Elegante. Fino. Educado. Bem fardado. Alinhado. ( alguns achavam até que ele era homossexual, os contra, lógico, os do PTB do Getúlio insinuavam que o cara era a bicha).

O irmão marista quando ficava brabo comigo na aula, gritava ,  ameaçava me bater, mostrava a régua, um metro de madeira de medir fazenda nas lojas, e dizia  -  " ainda por cima, teu pai é um herége, não é católico, não confessa, não comunga, não vai à missa, não frequenta a Igreja"  - bem aí, eu estava ralado - e ficava de castigo, na parede, de frente para a parede, de braços cruzados, lá na frente, de costas para a turma,  sob a foto do Getúlio,  até bater a sineta para o recreio.

E assim se passou minha infância em Antonio Prado. A foto do Getúlio na parede das salas de aula do colégio dos Maristas. E meu  pai, em casa, tomando vinho, no almoço, e dando discurso contra o Getúlio. Que paradoxo. Na aula venerado. Em casa execrado.
Bota confusão nisso na cabeça da criança.

Este ensinamento me serviu na vida de Juiz  para tratar igualmente a todos, na medida de sua desigualdade,   e me serve até hoje que me esforcei  para criar os tres flhos e agora ajudar na criação dos cinco netos.

Nério  "dei Mondadori" Letti.


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