quarta-feira, 8 de maio de 2013


FOGUEIRA DE LIVROS DÁ FELICIDADE?
João Eichbaum
joaoeichbaum@gmail.com
São muito poucas as pessoas que conhecem a Constituição Federal desta terra de samba, futebol e corrupção (esta mais do aquele, que está indo pro saco, muito antes da copa). E quando falo em pessoas, falo de todos, inclusive do pessoal de toga.
Essa ignorância, como toda a ignorância, tem explicação. Três explicações. Primeira delas, a deficiência que atinge a maioria absoluta da população, nela se incluindo bacharéis, mestres, ministros e doutores: o "analfabetismo funcional".
Para quem não sabe o que é o "analfabetismo funcional", explico. Segundo estatística do INAF (Instituto Nacional do Analfabetismo Funcional), 78 % das pessoas alfabetizadas, embora leiam, não conseguem interpretar o texto lido ou, conquanto consigam escrever, não sabem transmitir, de modo inteligível e de conformidade com as regras gramaticais, seu pensamento. Essas pessoas são "analfabetos funcionais".
A segunda explicação está no próprio texto constitucional, que não passa de uma colcha de retalhos, remendada a toda hora, ao sabor de conveniências, acordos bastardos e improvisos. É um texto que nenhum verdadeiro cientista de Direito Constitucional elegeria como paradigma. Passa longe de qualquer fundamento científico nessa área. É por isso que o STF e outros juristas, que não tiveram padrinhos de alto coturno para vestirem a toga de ministro, deitam e rolam em cima desse livrinho.
Terceira explicação: a pusilanimidade.
Tomemos o caso de um princípio consagrado pela Constituição nos incisos IV e IX do art. 5º e no caput do art. 220 e seu § 2º: o pleno direito à liberdade de pensamento e à criação literária. Pleno, sem restrições, vedada expressamente a censura.
 Esse direito foi desrespeitado pelo STF por pusilanimidade, quando proibiu a circulação dos livros da Editora Revisão. Tal vilipêndio gerou uma filiação bastarda, que se vai proliferando. Volta e meia, juízos e tribunais têm se ocupado com o clamor de quem quer ver livros ardendo nas fogueiras de uma "inquisição" ressuscitada especialmente para o ensejo.
Então, seja por "analfabetismo funcional", seja por desperdício de razões que confundem o reto com as têmporas, seja por pusilanimidade, vão para a fogueira também os textos constitucionais que proibem a censura e garantem a liberdade de expressão e de criação artística e literária.
A Constituição, apesar de todos os remendos de acolchoado velho, estabeleceu um direito que ainda se mantém intátil: o da igualdade. Quer dizer, ninguém vale mais do que ninguém. Quem morreu não vale mais do que os vivos. Quem ainda vive não vale mais do que os mortos - salvo para a Fazenda Pública, claro.
E quem se sentir ofendido por alguma expressão de pensamento terá o direito à reparação. Mas essa não consistirá na queima dos livros, nem no veto à sua circulação. Para lavar a alma a Constituição autoriza uma reparação de natureza econômica.
Porque todos são iguais perante a lei: o escritor tem o direito de escrever, e todos os cidadãos têm o direito à honra. O direito à honra não elimina o direito de expressão do pensamento. E o direito de expressão do pensamento não se sobrepõe ao direito à honra.
Não sei se uma indenização recompõe a honra e os reveses da alma, não sei se o dinheiro apaga a dor.  Há quem, não contente com isso, busque a felicidade completa, com dinheiro na conta e livros na fogueira.
 É nessa hora que a gente fica sabendo que é que conhece a Constituição Federal.

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