terça-feira, 1 de março de 2016

A VIDA

João Eichbaum

Qual foi o melhor pensamento, a melhor frase, a ideia mais concreta que Jesus Cristo expressou sobre a vida? Qual foi o melhor estímulo dele, para que as criaturas humanas gostassem de viver, esquecendo as agruras, as dores, as perdas, e a presença sempre ameaçadora da morte? Não furtar, não matar. Tudo bem. Mas, “não desejar a mulher do próximo”? Ah, não! Pode parar. Mulher não é coisa. Só coisa tem dono.

E São Paulo disse alguma coisa sobre a miséria da vida? Sim: “o amor tudo suporta”. Tudo suporta, uma ova. Só suporta tudo quem gosta de ser corno. E o festejado “doutor” São Tomás de Aquino? Esse aninhava no coração um ódio demente contra os incréus, contradizendo a indulgência que atribuía a Deus. A felicidade do ser humano ele transferia para depois da morte.

E tantos outros filósofos de araque, pregoeiros dos discursos de Jesus Cristo, que dão mais importância à morte do que à vida, disseram algo aproveitável, para que o povo fosse levando a vida mais ou menos, até o apito final?

O único a dizer alguma coisa que prestasse, servindo pelo menos de consolo, no meio de todo esse bombardeio, que é a vida, foi Antoine de Saint-Exupéry. Mas não foi aquela frase que qualquer analfabeto funcional repete, sem saber o que está dizendo, “o essencial é invisível aos olhos”. Minha tataravó, vacinada contra os feitiços da glória, já dizia a mesma coisa, com mais simplicidade: “quem vê cara, não vê coração”.

Quando já havia superado a fase das bobagens escritas em “O Pequeno Príncipe”, Saint-Exupéry definiu a vida nesse pequeno poema: “assim vai a vida: plantamos durante anos, mas o tempo destrói esse trabalho, arranca essas árvores; um por um, nossos companheiros nos retiram sua sombra, e aos nossos lutos se junta a secreta mágoa de envelhecer”.

Poesia, sim. Mas é a única poesia que sintetiza a vida. Assim mesmo, não esgota o tema. Esse só foi tratado com a seriedade e a crueza que merece, derrotando todos os dogmas, todas as inconsistências da teologia e todas as artificialidades poéticas, por um anônimo que pichou num muro em Santa Maria o seguinte: VOCÊ NASCE SEM PEDIR E MORRE SEM QUERER, POR ISSO APROVEITE O INTERVALO PARA SER FELIZ.




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