segunda-feira, 2 de junho de 2008

PORQUE NÃO ACREDITO NA JUSTIÇA

QUE SAÚDE!

João Eichbaum

Palavras comedidas, prenhes de modéstia, da juíza de Santa Maria ao jornal Zero Hora, em reportagem publicada no dia de ontem:

“Não sou eu que estou ali, é a instituição. Eu apareço como a Justiça Federal. Se tivesse escolha, pessoalmente, não gostaria de aparecer”

Ah, bom, então tá! Não é aquela senhora, ou senhorita, de olhos verdes, segundo se diz na reportagem, que veio de Três de Maio para fazer faculdade de direito em Santa Maria, a que apareceu na matéria do mesmo jornal uns dias antes, para receber a denúncia, numa modalidade não prevista no Código de Processo Penal. Quem apareceu ali foi a “instituição”, isto é, a justiça, aquela que usa venda, balança e espada, tem um vestido comprido e não mostra os peitos. Só que a “instituição”, dessa vez, desceu do olimpo, se encarnou numa recatada, circunspecta e comedida senhora, ou senhorita, tirou a venda, jogou a espada e a balança para o lado, entrou no clima da imprensa, e se esbaldou mais do que japonês no samba, dando ruidosas explicações.
A gente entende, porque a justiça, quer dizer, a “instituição”, realmente, precisa dar explicações. A justiça precisa de propaganda, publicidade, matéria nos jornais, porque é a única forma de se saber que ela existe e o que faz com o nosso dinheiro. Essa senhora, ou senhorita, que é juíza em Santa Maria, foi ferida em sua modéstia, porque “não teve escolha”, sendo, portanto, constrangida a aparecer “como a Justiça Federal” nos jornais, nas televisões e nos microfones, para emprestar ao ato processual do recebimento da denúncia uma estridência que não encontra eco no princípio constitucional da inocência presumida (art. 5º, inc. LVII da Constituição Federal). Se dependesse dela, pessoalmente, como ela diz, “não gostaria de aparecer” – ressalte-se. Afinal, ela não é como a sua vizinha, a Gisele Bündchen, que não só gosta disso, como não se peja de mostrar aquela magreza brochante para todo o mundo.
Pobre senhora, ou senhorita, juíza! A “Justiça Federal”, ou seja, a “instituição” que gosta de aparecer, ou precisa disso, se valeu da juíza de Santa Maria, uma pessoa de confessada modéstia, para satisfazer seus caprichos, para mostrar ao povo que ela existe. A juíza, essa senhora, ou senhorita, que – tudo dito pelo jornal - é atleta, corre pelas ruas da cidade, onde pratica as artes do direito, e leciona em duas faculdades, ainda tem que percorrer mais de trezentos quilômetros até São Leopoldo, onde o comércio educacional dos jesuítas oferece cursinho de doutorado. Apesar de todos esses afazeres, foi usada, “ut serva”, pela “Justiça Federal”, a “instituição” que apareceu pomposamente na mídia.
E através de tudo quanto disse a senhora, ou senhorita, juíza, os contribuintes ficaram sabendo onde vai parar o dinheiro que pagam pelos serviços dessa morosa e incerta, mas erudita “justiça”.
Ah, um detalhe! A senhora, ou senhorita, que deve gozar de uma saúde de ferro para fazer tanta coisa ao mesmo tempo, tem – segundo diz o jornal – três mil processos para julgar. Mas, isso é de somenos importância.

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