terça-feira, 30 de setembro de 2008

COISAS DA VIDA

DEMAGOGIA IRRESPONSÁVEL

João Eichbaum
Político nunca foi e nem será jamais sinônimo de administrador. Democracia é a maior balela que se impinge ao povo, para beneficiar uns poucos políticos e sua companheirada. E se confunde democracia com demagogia.
A partir dessa premissa, outra não pode ser a conclusão: enquanto o país for “administrado” por políticos, essa espécie de “democracia” vai continuar imperando, para beneficiar os aproveitadores
O Brasil está cheio de crianças mendigando pelas ruas, pedindo nas sinaleiras, se oferecendo para “dar uma olhada no carro”, dormindo ao relento. Na parte sul, a prostituição infantil é mascarada, mas nos estados do nordeste chega a ser quase institucionalizada, sendo um item que atrai tarados com as carteiras recheadas de dólares e que são pomposamente chamados de “turistas”.
Ao invés de educar a população pobre, criando nela a responsabilidade paterna, o atual governo, que tem à testa um operário, migrante do nordeste, - pessoa que nunca administrou sequer uma tendinha de cachorro quente – incentiva a proliferação de crianças, através de um engodo social chamado “bolsa-família”. Quanto mais filhos tiverem os pobres, maiores serão os benefícios que irão auferir. Partindo exatamente de quem nunca administrou coisa alguma, o benefício do “bolsa-família” em nada ajuda na formação das pessoas, no incentivo para a busca de um emprego. É simplesmente um dinheiro tirado do contribuinte para que o partido do governo faça esmola com ele, dando lições de “democracia”.
Depois do “bolsa-família”, não poderia vir coisa melhor, e tudo pode acontecer. Como aconteceu com a recente promulgação da lei que veda o emprego de doméstica para menores de quatorze anos.
Então, menor de quatorze anos não pode ser doméstica, ter carteira assinada, contribuir para a Previdência Social, investindo na segurança para sua velhice ou para uma eventual incapacidade. Mas pode ser prostituta, pode se entregar às drogas, porque esse mesmo governo “democrático” nada faz para impedi-lo. O que ele impede, pura e simplesmente, é que se lhes dê emprego.
Por que tudo isso? Ora, por que! As meninas já tem o “bolsa-família”, não precisam trabalhar. O trabalho, na concepção desse governo, não dignifica as pessoas, o que as dignifica é a esmola oficial, que lhes incentiva a preguiça.
A admissão de uma empregada doméstica é assunto interno, da família. Governo nenhum tem o direito de limitar a administração de um lar. Muitas vezes, a companhia que exige uma criança é outra criança. Tudo depende do critério dos pais: ao invés de contratarem, como “babá”, alguém já viciado, com defeitos perigosos, é claro que preferirão, em muitos casos, meninas sem vícios, a quem poderão educar, nos padrões éticos da família.
A grande marca da “democracia” do governo petista é a proibição: a Lei Seca, o desarmamento, o fumo em lugares públicos, e agora essa a dignidade do emprego no seio de uma família. É mais cômodo, não dá trabalho algum proibir. O que dá trabalho, que é tirar as meninas da mendicância e da prostituição, ah, isso o governo petista não faz. Se o fizesse, faltaria dinheiro para a companheirada.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

MAIS DESÍGNIOS DA PAIXÃO
Paulo Wainberg




Paixão é coisa traiçoeira que domina você de repente, sem dar tempo para suas defesas entrarem em ação.
Um simples olhar, um aperto de mão, uma frase dita ao acaso e lá está você, a mercê de uma emoção que vai controlar sua vida, gerar expectativas, fabricar sonhos e, como é inevitável, encher você de medo.
A paixão tira a sua naturalidade e aquilo que você diria normalmente adquire forte carga de significado e tudo o que você ouviria normalmente passa a ser correspondência, porque o apaixonado deseja, mais do que qualquer outra coisa, que o objeto de sua paixão esteja também apaixonado.
As paixões proibidas são as de melhor qualidade, uma espécie de lei seca que faz com que aquele que nunca ingeriu bebida alcoólica beba, pelo simples prazer de transgredir.
O que é paixão proibida? É quando você se apaixona por quem não deveria, no dizer da moral religiosa predominante.
É quando você se apaixona pela mulher ou pelo marido de um amigo, de uma amiga. É quando você se apaixona pela freira ou pelo padre, pela mulher bem mais jovem, pelo homem bem mais velho, por uma tia ou um cunhado.
É quando você sabe que, se realizar a paixão, vai provocar sofrimento, rupturas, é quando você tem certeza que realizar tal paixão vai mudar sua vida de modo definitivo e irrevogável.
E é justamente essa paixão que você mais deseja, com a qual você sonha mas nunca tem coragem de admitir nem de permitir porque você não quer se complicar, você que organizou sua vida e está contente com ela, disposto a encerrar seu ciclo usufruindo as conquistas afetivas e, ai de mim, morrer em paz.
Porém, por mais que tenha construído essa imagem, você não é de ferro, seu coração bate forte e sua respiração, às vezes, se acelera por isto ou aquilo, nem que seja um gol do seu time no último segundo da prorrogação.
A paixão faz você sofrer, prezado telespectador, por causa do medo, da dúvida, da incerteza e, sobre todas as coisas, acima do mais elevado pico gelado do Everest, de revelar-se e mostrar-se ridiculamente ao mundo como alguém mínimo, um reles mau caráter que não respeita ninguém, o passado e seus princípios.
O que fazer com a paixão, senhor apaixonado? Como lidar com ela? Como revelar seu sentimento, sua nuclear e atômica emoção, sem correr o risco do linchamento público?
Honestamente, não sei.
Acho que precisa contar com a sorte, que a pessoa por quem você se apaixonou seja sensível e compreensiva, que trate de corresponder à sua paixão ou, caso contrário, entenda o que você sinta e mantenha a revelação no limite de vocês dois, tratando de perdoar a ousadia e poupar você da degradação pública.
O grande drama do apaixonado é que ele vive de indícios, de demonstrações casuais que, para ele, assumem significados sublimes: um olhar mais demorado, um aperto de mão prolongado, um gesto de carinho sutil, como cruzar os dedos, um e-mail com reticências... e o apaixonado se crê correspondido e, ainda que não revele explicitamente sua paixão, alimenta-se por dias e noites, principalmente noites, de fantasias inebriantes de felicidade máxima onde os beijos e os abraços imaginários são fogueiras de emoção e embalam o sono e os sonhos.
O apaixonado vive no mundo virtual da fantasia e se, por ventura, a fantasia transformar-se em realidade, será ele um dos raros (mas não poucos) a compreender o verdadeiro significado da vida.
Jogos de sedução, frases de duplo sentido, apertos de mão socialmente aceitáveis e ricas em significados e as pequenas confidências cotidianas fazem parte do “pode ser”, no imaginário do apaixonado que se alimenta dos possíveis indicativos como quem sorve a última gota de água.
Estar apaixonado é viver em dúvida, pisar em ovos, caminhar em terreno minado e, acima de tudo, torcer pelo final feliz, pelo momento sublime da realização da paixão.
Imagino que quando isto ocorre, quando o apaixonado está finalmente com sua paixão, pronto a desfrutar as emoções contidas, a deflagrar a intensidade da sua paixão, o sagrado faz sentido e neste momento a idéia de “divino” torna-se compreensível.
O encontro de dois apaixonados é sagrado e divino, para sempre e para a eternidade.
Felizes são os que se permitem, mesmo que contra tudo e contra todos, sentir tal imensurável intensidade de emoção.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

JURISTAS: UMA ESPÉCIE EM EXTINÇÃO

OS JUÍZES DO HOJE
João Eichbaum

Vou declinar o nome dele: foi o Paulo Wainberg. Outro dia, ou melhor, outra noite, entre um chope e outro, no Barranco, ele me olhou firme, como é do seu feitio, e sentenciou: João, o modelo de juiz que tu buscas já não existe mais.
Fui ruminando a frase do Paulo e, quando cheguei em casa, dei a mão à palmatória. Realmente, o paradigma de magistrado foi para o espaço. Aqueles senhores sisudos, de poucas palavras e olhar penetrante, dominador, cuja presença era suficiente para impor respeito numa audiência, já não existem.
O que vemos hoje são meninas e meninos deslumbrados com o poder e com os altos vencimentos que ganham, que mal sabem redigir uma frase em vernáculo correto e contam com assessores, secretários e estagiários, que sabem muito menos, tanto de vernáculo como de direito, para lhes redigir despachos e sentenças.
E isso se deve, antes de mais nada, às inúmeras faculdades de direito que foram instaladas pelo país afora. Em qualquer recanto, em qualquer lugarejo existe uma faculdade de direito. Há cidades do interior, como Santa Maria, por exemplo, no Rio Grande do Sul, que possuem cinco faculdades de direito.
Os juízes e advogados de antigamente eram obrigados a disputar as poucas vagas que havia nas universidades públicas. O corpo docente dessas era composto por juristas de escol, pessoas de cultura invejável, como Pontes de Miranda, por exemplo. Com base numa cultura humanística sem igual, é evidente que os atraídos para o magistério eram pessoas sábias, de conhecimento respeitável. Depois começaram a surgir as universidades particulares, onde ingressavam professores que não prestavam concurso – o concurso que era exigido para a cátedra das universidades públicas. E como tais universidades eram, geralmente, ligadas às instituições católicas, a “conditio sine qua non” para a composição do corpo docente era, em primeiro lugar, a religiosidade do candidato a professor, e não a sua cultura, o peso de seus conhecimentos.
Por aí começou a “popularização” do direito, que acabou com a elite cultural. Atualmente, qualquer um pode ser professor, desde que seja bacharel em direito. Nem mesmo o concurso, exigido pela universidade pública, representa, hoje, a garantia de que o candidato a professor tenha uma bagagem cultural respeitável. Em primeiro lugar, porque a cultura está nivelada por baixo. Em segundo lugar porque, alunos formados em universidades particulares, tendo debaixo do braço um diploma de “mestre”, já são considerados respeitáveis e podem concorrer às vagas do magistério público.
E, em conseqüência, qualquer um pode ser juiz, por duas razões: por sorte, fazendo cruzinhas, e porque os examinadores dos concursos não avaliam os candidatos, mas se limitam a contar o número das cruzinhas certas.
Portanto, dou a mão à palmatória: juízes como antigamente, nunca mais. Para encerrar, eu poderia me gabar: para ser juiz, tive que começar, traduzindo a Eneida, de Virgílio. Mas, nem digo isso, porque muitos juízes e desembargadores, alguns ministros do STJ e do STF, poderiam pensar que, para ser juiz, eu tive que comer a mulher do Virgílio.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

crônicas aparentes

SER E PARECER
Paulo Wainberg



Somos modernos, logo temos que parecer. Quasímodo era e não parecia, logo foi punido. Torquemada parecia mas não era, logo foi temido.
Entre ser e parecer há o abismo a ser transposto, das relações sociais, das convenções aparentes, do mostrar-se, exibir-se e tornar-se, por menos que seja, referência e padrão.
Quem é não precisa disso, basta-se em si mesmo, sabendo-se ser sem ostentar, sendo mais do que tendo e quando calha de ser e ter, transforma o ter em doar e o ser em abençoar.
Quem parece, perdoem-me os aparentes, não sente, mostra-se. Quem parece não conhece, exibe-se.
Quem parece tenta ser, mostrar-se como quem é, gostando do que não gosta, falando do que não sabe, unindo palavras vãs, pérolas literárias, vagalumes aos luar, mariposas do entardecer, flores a perfumar, metáforas simbióticas, refinadas na aparências, tênues como a palha a desmascarar supimpas pretensões, a esnobar peles refeitas, riqueza das frases feitas ocultando a descompaixão, a falta da amizade, o tudo pelo social.
Quem é erra, falha e se engana.
Quem parece acerta sempre porque nunca diz o que é.
Quem erra sofre, se angustia, se atormenta e cresce.
Quem parece ri e sempre pega leve. Salvo quando querem tirar algo seu. Aí se insurge, verte lágrimas aparentes porque já codificou o modo de, ali adiante, parecer o que sempre pareceu, acima de tudo parecer... e que ninguém desconfie que não é.
Quem é tem o que é.
Quem parece precisa ter ou deixa de parecer.
O que é melhor? Ser ou parecer?
Honestamente não sei. Há quem parece ser e há quem é sem parecer.
Ser e parecer ou parecer sem ser?
Rico e com saúde ou pobre e doente? Mil peixes no oceano ou um na panela?
Uma coisa é ser na vida, outra é ser no cotidiano.
Ser na vida é um resumo post-mortem, uma página no obituário, dez festejos dos cem anos de nascimento. Ou de morte. E uma placa de bronze. Ser no cotidiano é mil práticas relativas, lâmpadas a serem trocadas, contas a serem pagar, vazamentos a vedar, vasos sanitários a desentupir, dinheiro para ganhar e ter hora certa para chegar.
Parecer na vida é um olvido post-mortem. Talvez uma risadinha futura das bobagens proferidas. Parecer no cotidiano é proferir ufas admirados, vivas estabanados, pegar leve no sufoco e decorar marcas de vinhos.
Ser ou ter, eis a questão que nem o Bardo ousou questionar.
Quem é usufrui-se na solidão. Quem parece desfruta da multidão.
Ser ou parecer, eis a questão.
Conheço tantos que parecem e lutam por ser, lutam tanto que acabam sendo mas, para mal deles, não abdicam de parecer e por isso parece que não são.
Pois quem é não alardeia e concede caridosamente, a quem parece, a ilusão de ser.
Conheço tantos que são mas sucumbem à vaidade de parecer e tanto parecem que parecem que não são.
Quem é não parece, mas acaba aparecendo, cedo ou tarde.
Qual a importância desse assunto é coisa que também me pergunto.
Qual a diferença entre quem é e quem parece é pergunta que também me faço.
Mas suspeito que há uma semelhança entre ser e parecer. Suspeita assim, de leve, sem convicção e totalmente aberta à discussão.
Você não acha que aquele que é e aquele que parece que é estão à serviço da vaidade?
Eu acho, aí reside minha suspeita. E se eu estiver certo, pragmaticamente falando e considerando que a vaidade está posta em benefício alheio, quero dizer, o vaidoso (e quem não é?) quer a aprovação e o reconhecimento alheio, ser e parecer acabam servindo ao propósito egocêntrico, simultaneamente individual e coletivo, de ser admirado pelo outrem.
Quem é o outrem? Qualquer um que não seja você (ou eu).
No Encontro Final, quando quem é e quem parece atingem a linha de chegada, restará um nome de rua, um nome de praça, um relógio de despedida, um livro biográfico, um verbete no dicionário, meia página na enciclopédia, uma vaga lembrança de um neto, uma saudade passageira, uma lágrima compassiva, um adeus individual e uma foto na lápide.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

COISAS DA VIDA

A CIÊNCIA E AS HISTÓRIAS MAL CONTADAS

João Eichbaum

À medida que a ciência avança, ou à medida que o primata homem se distancia mais e mais de seus ascendentes símios, a religião, que tem, entre seus líderes, primatas cuja inteligência também evolui, é obrigada a ceder terreno, procurando evitar bobagens homéricas como a que fez com Galileu Galilei.
Segundo matéria publicada na revista Veja, em 1950 o Papa Pio XII já dizia que não existem contradições entre a teoria de Charles Darwin e a doutrina cristã, no sentido de que uma não exclui a outra. Rafael Martinez, sacerdote espanhol e professor de história da ciência na Pontifícia Universidade da Santa Cruz, em Roma, afirma, para a referida revista, que “os primeiros mal-entendidos a respeito da aceitação da teoria da evolução pela doutrina católica referem-se a uma interpretação literal da narração bíblica da criação”.
É a explicação dada pela religião cristã para a incompatibilidade que existe, sim, mas ela não admite, entre o que está escrito no Gênesis e a constatação da ciência, a respeito da evolução do primata humano.
É claro que a historinha aquela, de que “Deus” apanhou um punhado de barro e com ele fez o homem, depois tirou a costela do homem e com ela fez a mulher, é completamente absurda, e não serve hoje nem para fazer as criancinhas dormirem. Até porque, com sua inteligência evoluída, as criancinhas hoje estão mais ligadas no computador do que na catequese.
Pelo que diz o padre Rafael Martinez, não se deve interpretar “literalmente” o que está escrito na Bíblia. Donde se infere que o que ali está escrito não está escrito.
Então, o que é que está escrito no Gênesis?
“Hoje sabemos que a sabedoria divina criou o mundo, utilizando as forças da natureza”, diz o referido padre, professor de História da Ciência.
Ah, bom! Então quer dizer que “as forças da natureza” já existiam e estavam sem serviço, sem proveito, sem fazer nada, razão pela qual “Deus” resolveu reciclar o material e com ele “criar o mundo”? Ou será que “Deus” construiu o seu LHG (grande acelerador de hádrons) e provocou o “Big-Bang”, só para passar o tempo (que na eternidade não passa nunca) e se divertir?
Se assim foi, ele deve ter feito isso e dito, ao mesmo tempo; “seja o que Eu quiser...”. E deu no que deu.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

SECULARES
Paulo Wainberg





Ao contrário do que se pensa, Maquiavel não foi um preconizador e sim um retratista.
Vivendo na Itália renascentista, protegido pelos Médici e abandonado pelos Borgia, sua obra prima, O Príncipe, é uma constatação do exercício do Poder e não uma apologia de doutrinas pedagógicas para alcançá-lo e mantê-lo.
Ao afirmar que o Príncipe deve ser capaz de toda a crueldade de uma só vez para alcançar o “bem comum”, distribuindo as benesses das conquistas ao poucos para que pudessem ser devidamente apreciadas, consagrou, como princípio, aquilo que simplesmente percebia na forma de agir dos governantes de seu tempo e dos que historicamente pesquisara: os fins justificam os meios.
Teve a coragem, como um observador imparcial, de separar a Ética da Política, colocando-as em planos distintos e incompatíveis entre si, como se uma fosse a contradição em termos da outra.
Aquilo que Maquiavel percebeu e descreveu é uma perfeita síntese do que chamamos de “sociedade organizada”, a metáfora perfeita para o exercício do cinismo e da hipocrisia dos governantes da circunstância, os poderosos da ocasião.
O todo poderoso do momento é o execrado na manhã seguinte, fugitivo e tratado como reles criminoso, assim que a roda da fortuna gira e o que estava no ápice chafurda na sarjeta.
Napoleão, da glória ao ostracismo. Stalin e Hitler, terroristas de Estado, do Poder Supremo à exemplos do nefasto, nefando e horrendo.
Ditadores pelo mundo, cuja vontade absoluta fazia tremer o mais poderoso general, fugindo esbaforidos para usufruirem, se possível, dos milhões amealhados no exterior.
Na sociedade religiosa a Ética estuda o Bem e o Mal, conceitos superiores que exigem personificação absoluta: Deus e Diabo.
Na sociedade humana a Ética estuda a prevenção, uma construção racional para fundamentar a Lei e o Direito em favor da defesa do benefício contra os ataques malignos da própria sociedade humana. O Bem e o Mal éticos pressupõem não divindades e demônios e sim o ser humano em conflito com ele mesmo.
É neste ponto que a contradição emerge de forma “maquiavélica”. Nessa linha de raciocínio o “bem comum” sobrepõe-se ao “bem individual”, o interesse coletivo sobrepuja o interesse do indivíduo que pode ser sacrificado em quantidade indefinida, desde que se proteja o “todo”.
Para o Direito Penal é preferível manter dez culpados soltos do que um inocente preso, numa aparente contradição pois esse princípio protege o indivíduo na sua contrapartida com a coletividade.
Ora, para a coletividade, é preferível prender os dez culpados mesmo que um inocente seja preso e aí reside o cinismo sem nenhuma metáfora que o sustente. Dez perigosos criminosos à solta fazem muito mais mal á sociedade do que um inocente preso,graças à um erro judiciário que, para o mundo ideal do Direito, é inconcebível.
É que o Direito, assim como a Ética, paira no plano ideal, isto é, no mundo das idéias que, quase sempre, está muito distante das realidades. Neste mundo ideal exige-se dez criminosos presos e todos os inocentes soltos, o triunfo permanente do Bem sobre o Mal, criando-se instrumentos idealizados para atingir tais desígnios, como os Tribunais, os Parlamentos e os Governos.
Ninguém foi tão cinicamente hipócrita quanto a sociedade americana, por exemplo, ao pregar em sua Constituição, a igualdade e, na prática, exercer a discriminação racial.
O contexto assim organizado conduz ao inevitável choque entre o plano das idéias e o plano da realidade: a corrupção.
Todo ato de corrupção parte de um mesmo princípio, aparentemente inocente e vestido de legalidade por todos os lados: promover o bem comum e, com isso, obter vantagens individuais.
Corruptos e corruptores acreditam que não estão prejudicando ninguém, que o resultado de seus atos beneficiará, trará proveitos, gerará riquezas e que não há mal algum em ganhar um pouco, em obter proveito próprio, afinal é trabalho e, como tal, merecer ser remunerado.
O corrupto institucional alega, em sua defesa, que não viu qualquer ilegalidade em seu ato e o corruptor manifesta firmeza de propósitos no sentido de beneficiar em geral, principalmente àqueles que precisam dos benefícios.
Estamos cansados de ouvir essas declarações nas CPIs e nos processos judiciais que, por força da corrupta sistemática processual, tornam-se fins em si mesmos, inócuos e inconseqüentes.
A corrupção, seja em que nível for, é uma violação ética, um afrouxamento dos conceitos de Bem e Mal, seja do ponto religioso, seja do ponto de vista humano.
Com idêntica lógica perversa repetem-se as campanhas anuais de solidariedade oficial. Campanha do agasalho é uma delas, ano a ano deflagrada em tempos de inverno e de frio. Os governos que se sucedem mantêm, em suas agendas, a busca por roupas quentes para distribuir aos pobres, mesmo as usadas, rasgadas, depauperadas e fora de moda. Porque o importante é que os pobres não sintam frio ou, ao menos, não sintam tanto frio quanto sentiriam, não fossem as providências de uma primeira dama, de um secretário de governo ou de um ministro de Estado.
Não tem importância nenhuma que os pobres vistam-se com andrajos, continuem pobres e que, ano que vem, ainda pobres, se beneficiem novamente da caridade institucional com a qual os governos compram as consciências da “sociedade civil”.
Por que não acabar com a pobreza? Por que não abdicar de conviver com a miséria, por que não dizer Basta! à desigualdade e proporcionar a todos os cidadãos a capacidade de agasalhar-se no inverno?
Porque os fins justificam os meios, simplesmente por isso. Porque é preciso ser cruel de uma só vez com alguns, em benefício de todos, como se alguns não pertencessem ao contingente de todos.
Porque a máquina contábil das oferendas e das distribuições de roupas e alimentos não pode ser interrompida, isso seria um fator menor de faturamento político, de alcance de votos e de projetos políticos antagônicos, a alardear a discrepância como se dela jamais tivessem feito parte.
Do Século XV de Maquiavel ao Século XXI de Bush, da Comunidade Européia, de Hugo Chaves, de Lula e de Osama Bin Laden, o Príncipe reina sem dó nem piedade, duela a quien duela, porque afinal de contas, disso sabemos todos, os fins justificam os meios.
O pior de tudo é: E adianta falar?

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

VARIAÇÕES EM TORNO DO TEMA FIADASPUTAS

DONDE VEM ESSE DINHEIRO?

João Eichbaum

Já foi pior. Mas, mesmo assim, ainda incomoda. Falo da propaganda eleitoral. Agora, pelo menos, estamos livres de pixações, papéis grudados nos postes, faixas bestas se enroscando nos fios de luz, etc.
Mas ainda existem os malditos “carros de som” que nos ferem os ouvidos, atrapalham a nossa concentração, a nossa sesta, o sono das crianças.
E tem também as passeatas, essas que atrapalham o trânsito – já não chega o MST e outros “movimentos sociais” de gente preguiçosa, que nada tem a fazer na vida, senão perturbar a vida dos outros.
E até a tal de “Justiça Eleitoral” nos enche o saco, fazendo propaganda dela mesmo e nos impingindo lições de civismo, pintando todos os candidatos como potenciais criaturas honestas e competentes, quando todos nós sabemos que quem precisa trabalhar e é honesto não tem tempo para se dedicar à política.
Mas o que mais chama a atenção nestas eleições é a propaganda avassaladora dos candidatos do PT, em qualquer lugar. Há enormes diferenças entre a propaganda dos companheiros do Lula e a dos partidos que com eles não se alinham.
Alguém aí se lembra do PT, quando iniciou na política, para dar seguimento à carreira de ex-torneiro mecânico Lula? O PT não era nada, não tinha nada. Mas agora, depois de chegar ao poder, mudou completamente. É o partido que mais esbanja, porque tem mais dinheiro. E donde vem esse dinheiro? Foi algum Jesus Cristo que fez o milagre da multiplicação?
Será que o povo não se dá conta disso? Será que esse mistério não chama a atenção nem da imprensa? Por que ninguém questiona isso? Por que se ocupam de grampos e outras bobagens e não perguntam donde o PT tira tanto dinheiro?
Partido dos “Trabalhadores”. Mas trabalhador tem tanto dinheiro assim?
É esse o povo que faz a cara do Brasil: o povo que festeja o PT, elege o PT, se embriaga com o domínio dos “trabalhadores”, tudo graças ao “bolsa-família”, que faz a alegria dos preguiçosos, daqueles que em nada contribuem para que o tesouro nacional, guardado pelo PT, saia a distribuir por aí o nosso dinheiro.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

CRÔNICAS CONTO

AMORES VENIAIS
Paulo Wainberg


Glória conheceu Menezes na quermesse onde ela vendia maçãs do amor e ele era o catador de papeis. Enquanto isso Paco, aquele da Lucia, assava um coelho do Paulo, reservando uma pata para Tarcisio, um pobre meira vagabundo, vencido pela bebida.
Menezes tinha origem espanhola. O patriarca da família chamava-se Menez e teve tantos filhos que logo ficaram conhecidos como los Menezes, transformando em plural o sobrenome que antes era singular.
Glória, moça prendada e dada, também vendia beijos na quermesse e Menezes apressou-se em catar toda a papelada, receber seu parco salário e, com ele, comprar um beijo de Glória.
Antes pediu ao padre, encarregado do toca-discos cujos sons arranhados ecoavam na quermesse, tocando músicas de paz e amor, religião e fé, que pusesse a tocar “Boneca Cobiçada”, canção com a qual pretendia beijar Gloria e conquistar a jovem, depois de pagar o preço.
A voz de tenor inundou a praça: Boneca cobiçada, das noites de sereno, teu corpo não tem alma, tua boca tem veneno.
Menezes, com o coração aos trancos (e barrancos), postou-se diante de Glória, estendeu-lhe as notas e disse: - Quero um beijo. – E concluiu, sedutor: - tua boca tem veneno?
Paco, o da Lucia, virou o espeto para assar a barriga do coelho, que era do Paulo, conhecia Boneca Cobiçada de cor e salteado. Tomou de seu violão e dedilhou as cordas, entoando a melodia. Porém o tenor cantava em fá sustenido maior e Paco só sabia tocar em dó maior. Não se achou e abandonou a empreitada, fazendo um sinal a Tarcisio, o meira que mais parecia um farrapo humano, indicando que o logo o paulo coelho estaria pronto e ao ponto.
Foi o delírio.
Glória segurou o dinheiro com seus delicados dedos. Por aquela não esperava! Ia ter que beijar Menezes, o catador de papel? Olhou para o sorriso desdentado que se estampava, ansioso, diante dela e pensou, lá consigo mesma: “que droga, como é que escapo desta?”
Olhou para o relógio mas estava no horário de expediente. Não tinha como recusar.
As regras da quermesse eram sólidas, rígidas e imutáveis: quem pagava tinha direito ao beijo. Ai dela que recusasse! Nunca mais seria vendedora de maçãs do amor e de beijos, nas quermesses da igreja. O padre não negociava tais questões.
Paco, o da Lucia, com o dedo indicador, chamou o pobre meira, um Tarcisio arruinado que em trapo humano se transformara por causa de um amor sem sexo: o coelho estava pronto.
Tarcisio arrancou a pata com suas unhas imundas e comeu tudo, lambuzando a cara de gordura.
Foi a glória.
Glória, temente e temerosa, persignou-se, resignou-se e ofereceu os lábios ao Menezes, para um beijo de raspão. Porém Menezes segurou-lhe a nuca e enfiou-lhe a língua na boca, de chuá, indo-lhe cosquear os gargumilhos até sentir-lhe o ofego e o corpo ceder, puxando-a para fora da barraca e atracando-se-lhe nas coxas e no corpo todo, enquanto o tenor, no disco, repetia o refrão: Boneca cobiçada das noites de sereno, teu corpo não tem alma, tua boca tem veneno.
Foi o amasso.
O padre, com as bochechas rubras de justa indignação, percebeu o verdadeiro propósito de Menezes e trocou Boneca Cobiçada por Jesus Alegria dos Homens, esperando com isso sofregar os bestiais instintos de Menezes que, sinceramente, sentiu o golpe.
Não contava o pároco, entretanto, com as chamas internas que ardiam entranhamente em Glória, assim acesas por tanto deslavado beijo, linguado e sem dente, a ponto de responder aos assédios com a própria língua que, com sofreguidão, passava gulosa pelas gengivas nuas de Menezes, sentindo-lhe o excitante gosto de melaço com cachaça, palheiro e capim, sendo hábito do herói estar sempre a mastigar um.
Foi o espanto.
Paco, o da Lucia, retirou o coelho de Paulo do fogo, desprovido de uma pata, desespetou o assado colocando-o sobre um prato de alumínio. Abriu seu pote de farofa e, civilizado como era, colheu um pedaço de picanha com o garfo, banhou a carne suculenta na farofa e deliciou-se como há muito, observando Tarcisio, o meira desatinado, emborcar um gole do bico de uma garrafa de conhaque, estirado contra um tronco de árvore que lhe servia de poltrona, arrotar e coçar as bolas mal escondidas sob os andrajos esfarrapados que lhe serviam de calças.
Glória não desgrudava de Menezes que, sem pudor e sem vergonha, apertava-lhe a bunda contra o ventre, mostrando à jovem ao que viera, a pertinência do bastão, textura e contumácia.
Foi a grandeza.
O cura, à beira da apoplexia, trocou novamente o disco e, quando sobre a praça e por todos os ouvidos dos quermessantes retumbou o grito de ALELUIA do Messias de Handel, finalmente Glória recuperou o senso e, com inusitado esforço empurrou pelo peito o ensandecido Menezes e, cobrindo a face com delicados dedos, murmurou: - Ó Meu Deus, o que que tu vai pensar de mim? – E qual gazela arrepiada percebendo-se sob a mira do canhão ou, no caso, espingarda, jogou-se para trás da barraca onde vendia maçãs do amor e beijos, ajustou o decote e, com o sorriso virginal das indecentes, perguntou: - o próximo?
Coube ao destino designar que o próximo fosse justamente Menezes, vez que outro não existia, na fila.
O meira, tarcisiamente conformado, pegou uma bagana de traz da orelha esquerda e acendeu no lume da brasa ainda ardente, sobre a qual Paco, o da Lucia, assara o coelho, de Paulo. Deu duas tragadas, jogou a guimba longe e, com a filosofia acumulada em noites estreladas do sertão, vendavais gelados do Minuano e chuvas torrenciais do veranico de maio, sentenciou: - É isso aí – e pôs-se imediatamente a dormir.
Foi o auge.
Paco, o de Lucia, sorriu-se intimamente, com ar de sabedoria profunda e comeu o último naco do coelho, de Paulo, retomou seu violão e, alheio aos gritos aflitos do coral na vitrola, entoando: Rei dos Reis, Aleluia! Rei dos Reis, Aleluia!, dedilhou com basca suavidade pequenos trechos de uma zarzuela que vinha compondo há quinze anos.
Glória, tomada de louca paixão religiosa e beato fervor, recusou o dinheiro que Menezes colocara sobre o balcão, para um novo beijo. Ordenou que ele, Satanás em pessoa, saísse da frente dela, que não a tombasse em tentação, que sua alma, coração e corpo eram sagrados e a Deus dedicados ou, no mínimo, ao homem dos seus sonhos, coisa que Menezes, mesmo no plural, definitivamente não era. Persignou-se três vezes, beijou a unha do polegar da mão direita e rezou um Padre Nosso e uma Ave Maria com olhos postos no padre que, satisfeito e orgulhoso, considerou cá consigo que ele conhecia os fiéis de sua paróquia e, mentalmente, escreveu a carta que enviaria naquela noite mesmo ao Bispo, relatando sua vitória.
Foi o máximo.
Desconsolado mas não muito, Menezes gastou o resto do seu dinheiro no lupanar, afofado pelos amplos seios de Dagmar, uma mulata que só comia goiabada cascão...com muito queijo.
As vozes do coral infantil da Escola São João entoaram “eu vivo esperando e procurando um trevo no meu jardim”, marcando o final do primeiro dia da quermesse.
Tarcisio, meiramente borracho e mole liberou-se de seus gazes, Paco, o da Lucia, foi esperar por ela na saída da fábrica de sabão.
Glória recolheu as poucas maçãs do amor que restaram, fechou cuidadosamente a barraca, foi para a casa onde morava com sua avó mais velha, a quem cuidava, tomou um longo e masturbatório banho. Depois jantou com a avó e recolheu-se ao leito, ainda sentindo na boca o gosto de capim que herdara da boca de Menezes.
Um pouco antes de adormecer sentiu um calafrio só de lembrar que ainda havia seis dias de quermesse pela frente.
Foi a espera.

PIEGUICES

DEUS É PAI”

João Eichbaum

Há afirmações religiosas que partem do princípio de que todo mundo é ignorante. Por exemplo, dizem “Deus é Pai”.
Então comecemos por você. Você que é pai ou pretende ser pai. Que tipo de filho você quer gerar? Digamos, por hipótese, que você tenha o dom do onisciência e que, por isso mesmo, sabe o que vai acontecer no futuro. Você geraria um filho ladrão? Um filho bicha? Um filho assassino? Um filho vagabundo, que não quer nada com o batente? Um filho que nunca vai ter sorte na vida? Um filho doente, débil mental, com vida meramente vegetativa?
É claro que não. Por pior que você seja, por mais animalescos que sejam seus sentimentos, você não vai querer gerar um filho assim. É verdade que, na hora do bem bom, você pode até estar nem aí, o que quer é conquistar a fofinha, mostrar que você é bom de cama, etc. etc. Mas, nem nessa hora, se lhe fosse permitido pensar e prever o futuro, nem na hora do bem bom, você teria intenção de gerar um filho idiota, ladrão, vagabundo, etc..
Pai com paternidade perseguida, ou pai por acaso, nenhum primata humano geraria um filho com a intenção de torná-lo infeliz. Isso é próprio da espécie.
Mas será que entre os deuses a coisa é diferente? Os deuses que são oniscientes, que conhecem o passado, o presente e o futuro, geram filhos infelizes de maneira intencional? Se eles já sabem, de antemão, o que será da vida desse filho, mergulhado na dor, na miséria, no ilícito, na imoralidade, porque o geram, mesmo assim? Para se divertir com a desgraça?
Não. Me poupem. Não pode haver deuses assim. Se há seres com tais poderes, deuses não são, porque na perfeição de um deus não cabe o sadismo. O sadismo é próprio dos humanos e eles não o usam com a finalidade de gerar filhos. De um ato sádico até pode ser gerado um filho, animalescamente. Mas isso é próprio dos homens e não dos deuses.
Então, não me venham com essa de que “Deus é Pai”, a partir da consideração de que a maioria dos humanos é infeliz ou, na melhor das hipóteses, flutua entre a felicidade e a infelicidade, ao sabor da sorte.
Se quiserem inventar um “Deus”, que o inventem com outras características, que lhe tirem dos ombros a responsabilidade de ter criado o mundo e, de lambuja, o ser humano. Pai é quem cria – já diz um ditado muito conhecido. Mas quem cria mal, não pode ser pai.
Em se proclamando que “Deus é Pai”, além de se ofender a um suposto “Deus”, se profana o sentido da paternidade, atribuindo-se a esse “Deus” um sadismo que nem nos homens existe, que dirá nos deuses. Por tudo isso, tem carradas de razão Camilo Castelo Branco quando diz: “a pior calúnia que se pode assacar a um ente perfeito é imputar-lhe a criação do homem”.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

CRÔNICAS POETÍLICAS


A BALADA DO EGOISTA
Paulo Wainberg

É meu, é meu, é meu!
Para mim, para mim, para mim!
Sou eu, sou eu, sou eu!
Para sempre é meu,
Para mim,
Sou eu,
Até o fim!

Ganho de todas as fontes
Arreganho todas a frontes
Machuco os próximos, os distantes,
Os humildes e arrogantes,
Ótimos e ruins,
Parentes e afins
Sou eu, para mim,
Até o fim.

Desprezo quaisquer amores
Despetalo todas as flores,
Rio das lágrimas alheias,
Ofendo as bonitas e as feias
Faço pouco de quem veio
E daquele que não veio
Porque sou assim,
Sou eu, para mim,
Até o fim.

Idolatro-me no espelho,
Criança, jovem ou velho,
Embebedo-me de coragem,
Bêbado de valentia,
Vigor, certeza e ousadia,
Anjo, diabo e querubim
Eu sou assim,
Sou eu, para mim,
Até o fim.

Concedo quando convêm
E quando não, também.
Complacência covarde
Que se mostra cedo ou tarde
Nas mentiras de ocasião,
Dizendo sim quando é não,
Bancando ser quem não sou,
Gaguejando ou, ou...ou...
Qual um gago chinfrim,
Porque sou eu, para mim,
Até o fim.

E quando não tem saída
E está posto o dilema,
Não sofro nem tenho medo.
Sigo o rumo da rima,
Subo lá para cima
E sem pensar em ninguém
Que me goste ou queira bem,
Resolvo de vez o problema:
Despenco com alegria,
Desfrutando a euforia
De, até que um dia
E por fim,
Ser eu, para mim
Até o fim.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

VARIAÇÕES EM TORNO DO TEMA FIADASPUTAS

DEMOCRACIA

João Eichbaum

Você sabe o que é “democracia”?
Ah, você pensa que sabe, você acha que sabe, porque foi enganado a vida inteira pelo blá-blá-blá da escola, onde lhe ensinaram que “democracia é o governo do povo pelo povo”, dito que atribuem a Aristóteles que, na verdade nem sei se estava com essa bola toda.
Não, democracia não é isso. Democracia é o instrumento que alguns espertalhões usam para se manterem no poder, se regalando com trajes Armani, uísque quinze anos, rega-bofes homéricos, aplausos do povo idiota, manchetes de jornais, pesquisas de opinião e o resto que se foda.
“Democracia” é o poder nas mãos da “companheirada”, mesmo que essa companheirada seja composta por gente que serviu ditaduras, que bate palmas para ditadores, que não respeita a propriedade alheia, que atravanca o trânsito com passeatas de merda, impedindo que os verdadeiros trabalhadores toquem essa nação para frente. Se o poder e, conseqüentemente, o dinheiro arrecadado do bolso dos que trabalham, não estiver nas mãos da “companheirada” não é democracia.
Pois, em nome dessa “democracia”, eles começaram desarmando a gente. Cidadão pacato, honesto, pagador de impostos, não tem o direito de defesa. Aquilo que está escrito lá na Constituição, que todos têm o direito à vida e à liberdade, é só pra inglês ver, não é nada disso, vocês estão interpretando mal a Constituição, aquelas palavras não querem dizer o que vocês pensam que elas dizem, pois os guardiães da Constituição, ou seja, os ministros do Supremo Tribunal Federal, aqueles que têm medo de escuta e só dão” habeas corpus” para quem tem dinheiro, já deliberaram que o cidadão não tem o direito de se defender.
Depois, em nome dessa mesma “democracia”, proibiram o fumo. Você não tem mais o direito de tomar uma cervejinha, um uísque ou um cafezinho devidamente acompanhado por um cigarrinho, num bar. Se picar pode, à vontade, em qualquer lugar, mas fumar, ó, neca pau.
Em nome da “democracia” eles fecharam os bingos, onde os velhinhas e velhinhas iam fazer a sua fezinha, única distração barata a que podiam se arriscar, E também investiram contra as máquinas caça-níqueis. Tudo em nome da “democracia”.
E agora, também em nome da “democracia”, essa tal da “lei seca”. Quer dizer, aquela de você sair com a gata, no seu carrão, tomar um uísque antes, para que a cantada saia no tom correto, sem desafinação, também não tem mais. Aquilo é coisa do passado, em nome da “democracia”.
Enfim, faça as contas: lhe tiraram a liberdade. Você já não é dono do seu nariz, porque a “companheirada” resolveu cortar seus baratos, em nome da “democracia”.
Mas tudo é para proteger você. Você sabia disso? Tirando o direito de defesa, que lhe surrupiaram e não deram explicação, o resto, isto é, o fumo, a bebida foram proibidos para proteger a sua saúde, e o fechamento dos bingos e a destruição das máquinas caça-níqueis, para proteger o seu dinheiro. Assim, não precisando comprar remédio, nem fazer a sua fezinha, sobrará mais dinheiro para você entregar nas mãos da “companheirada” que manda na “democracia”.
Tudo isso é democracia, meu caro. Aristóteles não entendia bosta nenhuma disso tudo. Quem entende de “democracia” é a companheirada.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

SÓ PARA QUEM PODE
Paulo Wainberg



Não é para fazer gênero, bancar o moralista ou vergastar o populacho com ar de pernóstica superioridade, mas dois filmes pornográficos são suficientes para o resto da vida.
Mulheres e homens profissionalmente em ação, entra-e-sai vaginal, anal e bucal, gemidos guturais, ardentes, ferozes, estimulantes e esgotados têm, queiram ou não, seus limites em todas as escalas de som, velocidade, propagação à velocidade da luz, intensidade e níveis de satisfação, limites evidentes por cima, por baixo, de quatro, por trás, de ladinho, ao contrário e vice-versa.
Mulheres lascivas adorando jorros de esperma em rostos e seios, homens depilados a acentuar a grandeza peniana, vaginas escancaradas, ânus perfunctórios e olhares pré-definidos de sedução, alegria e prazer se auto-esgotam em cinco minutos de lufa-lufa, gerando uma espécie de torpor no espectador, mesmo o mais sacana.
Não é que eu não goste mas... é cansativo.
Após quinze minutos de incessante mexe-mexe, bota-e-tira, geme-e-grita e os infalíveis “yesss”, “babys” e “more, more” me sinto tão excitado quanto quando assisto a um documentário sobre as técnicas de irrigação e produção de nabos gigantes, na Lapônia.
Ora, direis, então não gostas de sexo? Acaso perdeste o tesão? O que não vislumbras em tão lindas mulheres e homens tão machos que te fazem perder o senso a ponto de entediares-te como quem, pela décima noite seguida, no jantar, como salmão defumado?
E eu vos direi: Transai para entender-me. Pois só quem transa pode ter ouvidos para ouvir gemidos, escutar sussurros e entender o coito.
Bilaquianamente falando, é isso.
Na prática é diferente e doravante, mulheres que me perdoem, é do ponto de vista masculino que o assunto segue.
O que é que os atores pornográficos têm que os outros homens não? De que modo eles conseguem tanta e constante rigidez que os torna capazes de tudo aquilo, à vista de câmeras, iluminadores, contra-regras, diretores, produtores, diretores de fotografia, assistentes de produção, Office-boys e uma mulher que está ali para uma ação mecânico-hidráulica, sem um pingo, um pinguinho sequer de emoção, tesão, apreço ou carinho?
Qual é o extraordinário poder que os faz aptos, a um simples toque ou nem isso, para as práticas inter e infra-fêmura, sodomistas e gomorrianas, eretos e altivos qual estandarte bélico a sustentar o galhardão em irredutível posição de ataque, pronto a penetrar e defenestrar, com ou sem vaselina, cuspe ou beijinho no pescoço?
E o volume, ilustre passageiro? Verdadeiros portentos em tamanho, envergadura, amplitude e espessura?
O que é isso? Onde é que já se viu?
E eles ali, firmes e com cara de enfado, como se fosse assim com todo o mundo. Afrontando sem pudor ou receio a grande massa “normal” do gênero masculino, reduzindo os adequadamente dotados ao sub-nível de subalternos incompetentes que precisam um pouco de, vá lá que seja, estímulo emocional agregado ao fisicamente natural para que o seu mediano baluarte diga ao que veio.
Franchement, aí está mais um bom motivo para evitarmos, os homens, tal gênero cinematográfico.
Já não nos bastassem os vestiários depois do futebol ou do tênis, as saunas masculinas e outros locais onde nos vemos frente a frente com o do outro, medindo forças e quase sempre nos deprimindo, assistir filmes pornográficos reduz a auto-estimativa valorativa da virilidade própria, quantitativamente falando, a índices perigosos do definitivo complexo de inferioridade.
Não assista, meu bom homem. Já não lhe bastam as comparações infantis com réguas escolares ou a risadinha safada de alguma garota? Você ainda precisa mais contundência para constatar que, apesar de tudo o que sua mãe sempre lhe disse, você não passa de um, no máximo, medianamente servido?
Sei, você deve estar pensando, se acaso ainda sofresse de priapismo? Mas nem isso. Príapo, você sabe, foi um deus grego, filho de Dionísio e Afrodite. Fruto da união entre o deus do vinho com a deusa do amor, quer mais? Hiper-dotado e sempre ereto, não sem motivo chamado de o deus da fertilidade.
Priapismo é aquela disfunção (?) que mantêm você erétil o tempo todo, com ou sem vontade, tendo ou não mulher por perto. O abençoado com esta doença (?) jamais, mas jamais mesmo, teve que dizer: “é a primeira vez que isto me acontece”. E jamais, mas jamais mesmo, teve que ouvir: “Calma meu bem, não precisa ter pressa, isso acontece com tudo o mundo”.
E jamais, mas jamais mesmo, teve que se cobrir com o lençol e ficar se perguntando o que deu errado na sua vida, por que isso só acontecesse com você e, o pior de tudo, o que ela vai pensar a seu respeito.
Porém nem tudo é tragédia.
Neste mundo moderno em que a rapidez é a tônica e você tem que se decidir em frações de segundo, uma dúvida você jamais terá, aliás, você viverá com uma certeza absoluta: você não será nunca um ator de filmes pornográficos.
Pelo menos é uma coisa a menos para você se preocupar.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

COISAS DA VIDA

MILHÕES DE IDIOTAS E MEIA DÚZIA DE GÊNIOS

João Eichbaum

A grande prova de que a evolução é um processo que faz parte da própria natureza se pode constatar a olho nu, nos primatas humanos.
No dia 10 último – um dia antes de mais um aniversário de uma das tantas atrocidades, movidas a idiotices, praticadas pelos ditos primatas humanos, a matança de 11 de setembro, nos Estados Unidos – estavam reunidos, na fronteira da França com a Suíça, um grupo de cientistas, engajados na tarefa de reproduzir o Big Bang, que, segundo teoria dominante, seria o responsável pela eclosão do universo.
A técnica empregada pelos cientistas consistiu em provocar a colisão de prótons (núcleos de átomos de hidrogênio) através do aparelho chamado GHC – Great Hadrons Colisor. A idéia de colisão – leia-se explosão – correu pelo mundo inteiro e, evidentemente, desencadeou a reação dos idiotas, que compõem a imensa maioria da humanidade
Uns idiotas temiam o fim do mundo. Outros, em número menor, tidos como “intelectuais”, como o cronista da Zero Hora Luiz Fernando Veríssimo, por exemplo, se opunham contra a experiência científica, como afirma o próprio Veríssimo, na edição da Zero Hora do dia 11 de setembro: “que proveito, salvo para a vaidade de cientistas, trará descobrir o que pretendem? Quanto mais se sabe sobre o funcionamento do Universo, mais aumentam a perplexidade e a angústia por não se saber mais, por jamais se poder compreender tudo – pelo menos com este cérebro que mal compreende a si mesmo”.
O medo dos primeiros dispensa comentários. Burrice nunca foi terreno fértil para análises e considerações. Mas a opinião de “intelectuais” revela a pequenez de seu intelecto. A se pensar como Luiz Fernando Veríssimo, o homem não deveria ter saído da caverna. Deveria ter permanecido lá, aquecido pelo fogo – que foi produzido graças às suas experiências, que poderiam lhe ter causado, e certamente causaram, queimaduras, ou incendiar o universo, tomado de florestas e outros materiais comburentes – se deleitando com o sexo e matando animais que passavam pela frente da caverna, para fazer fartos banquetes – infelizmente sem cerveja, sem discussões sobre futebol e sem comentários sobre mulheres.
Eis a prova da evolução. Enquanto uns primatas humanos, avançadíssimos, marcados pela genialidade, pela inteligência superior, acreditam na própria inteligência, outros, a maioria absoluta, se consolam com a idéia de permanecer macacos pelo resto da vida, submetidos à vontade de uma divindade que eles mesmos inventaram e que os enche de medos e ameaças – de par com a promessa de um paraíso eterno. Mas esquecem que, graças à sua ânsia de curiosidade, os gênios inventaram, para a delicia dos idiotas, a TV, a Internet e o Viagra.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

BARROQUICES ROCOQUIANAS
Paulo Wainberg



Sabe quanto tempo de sua vida você gasta piscando os olhos?
Esta transcendental questão científica percorreu os séculos ora inclinando-se numa direção, ora noutra, os sábios pesquisadores sofreram as perseguições do clero medieval, muitos outros foram sacrificados nas masmorras da Inquisição e alguns professores de filosofia, medíocres e frustrados porque nunca conseguiram ser filósofos, fizeram pouco da incógnita e a remeteram para um segundo plano na Teoria Geral do Conhecimento.
Finalmente, após a influência do Iluminismo Alemão, a ciência adonou-se da questão, arregaçou as mangas e foi à luta.
Duras batalhas foram travadas entre as diversas correntes de pesquisadores e estudiosos, sobretudo nos congressos internacionais que, por quase duzentos anos dominaram os noticiários e as discussões dos povos mundiais, em festas de casamento, bares e restaurantes, velórios e cabarés.
A mais célebre de todas as querelas aconteceu em meados do século XX, no Congresso Internacional de Ancara, na Turquia quando foi apresentado pelo grupo de cientistas dominante o resultado final de uma pesquisa realizada em todo planeta que envolveu mil milhões de pesquisados: o tempo que se gasta piscando os olhos é equivalente ao tempo que dura a vida do indivíduo.
Orgulhoso com a conclusão, o chefe da equipe de cientistas preparava-se para receber a consagradora salva de palmas dos congressistas quando um jovem, não mais de vinte e sete anos, dinamarquês de nascimento mas ioguslavo por opção, ergueu o dedo indicador da mão direita e, timidamente pediu a palavra.
Convidado para subir à tribuna, o jovem cientista declarou que ousava discordar do eminente colega porque, segunda suas próprias e individuais pesquisas, enquanto dorme ou quando está em estado de coma, o indivíduo não pisca. E esse tempo – que ele denominou de “não-pisco” – deveria ser descontado e só assim ter-se-ia o valor exato do tempo que se gasta, durante a vida, piscando os olhos.
O tumulto foi imediato! Os cientistas ali reunidos começaram uma discussão simultânea, cada uma falando no idioma de origem enquanto os flashes espoucavam, os repórteres corriam aos telefones e as televisões, incipientes na época, gravavam e transmitiam o bochincho com peculiar volúpia informativa.
Uma das coisas mais maravilhosas da Ciência consiste exatamente nisso: quando tudo parece descoberto, legislado e definitivamente assentado, eis que uma nova descoberta é feita e aquilo que parece terminado volta ao início.
O resultado daquele Congresso é que, nos anos e décadas seguintes, a Ciência tratou de descobrir se o indivíduo adormecido, em coma ou simplesmente de olhos fechados pisca ou não.
É bom esclarecer, para que não pairem dúvidas conceituais, que o tema abrangia apenas o campo da piscagem normal excluindo-se, por exceções, os portadores de cacoetes ou rictos faciais. Estes estavam fora, o assunto lidava apenas com a função biologicamente concebida de piscar os olhos com naturalidade. Outras hipóteses foram consideradas forçação de barra destinada a tumultuar a pesquisa.
Após exaustivo trabalho que contou com a abnegação inenarrável de cientistas em todo o planeta, muitos deles sofreram ações de divórcio porque jamais iam jantar em casa, a Ciência finalmente concluiu que o indivíduo em coma, adormecido ou de olhos fechados, pratica o, como denominaram, micro-pisco, uma espécie de piscagem latente, imperceptível a olho nu mas flagrado através dos mais sensíveis microscópios e aparelhos de ultrassom, ressonância e dedos polegares roçando pálpebras durante intermináveis horas, dias após dias.
Pouco mais de uma década depois, com o avanço tecnológico cibernético, revelou-se a ocorrência do, como foi denominado, “nano-pisco”, fenômeno que perdura por algumas horas após a morte do indivíduo.
Esta revelação desabou sobre a Humanidade como se as neves do Himalaia derretessem instantaneamente: o indivíduo gasta a totalidade de sua vida piscando os olhos e um pouco mais.
O primeiro trabalho científico decorrente foi um artigo publicado no Science Magazine do Memorial Institute of Science de Boston. Nele o articulista afirmava que se parássemos de gastar nosso tempo piscando os olhos viveríamos o dobro do tempo e um pouco mais, isto é, aquelas horas adicionais em que o “nano-pisco” continua operacional.
“Pare de piscar”, propunha o cientista, “e ganhe tempo de vida”. Algo semelhante ao que, décadas antes, fora proposto por outro cientista: se abandonarmos o hábito de dormir, ficaremos três quartos do nosso tempo de vida a mais, acordados.
O bafafá foi geral. Aqui e ali começaram a pipocar perguntas dramáticas: quanto tempo de nossa vida perdemos na fila do banco? Quantos segundos preciosos de nossa existência são gastos assoando o nariz? Quantas horas acumuladas de vida desperdiçamos em pé, no corredor do avião, carregados de pacotes, aguardando que as portas da aeronave se abram?
Aos poucos a Humanidade foi percebendo, não sem crescente melancolia, que gastamos o tempo que nos é destinado na vida com tantas coisas que o que sobra para viver é mínimo, insignificante, vários dígitos abaixo do zero na relação custo-benefício.
Algumas mentalidades mais pobres, espiritualmente falando, resolveram que, como tudo era desperdício de tempo, quanto tempo se perdia transando?, e iniciaram um movimento – com apoio religioso integral – para que se incluísse, como cláusula pétrea da Constituição, a limitação da prática do sexo em uma a cada cinco anos, definindo como crime hediondo o descumprimento da lei. Porém, à guisa de compensação, insistiam como obrigatória esta única relação sexual, a cada cinco anos.
O Senado viu a idéia com bons olhos mas rejeitou a idéia porque a coisa lá em baixo é outra.
Como tudo na vida é transitório, perder tempo piscando os olhos deixou de ser assunto porque em dois dias foi completamente esquecido pela mídia e, por conseqüência, pelo resto.
Mas a questão metafísica permanece: se depois de morto você continua piscando os olhos....?

terça-feira, 9 de setembro de 2008

VARIAÇÕES EM TORNO DO TEMA FIADASPUTAS

O GRAMPO
João Eichbaum

Grampo pra mim sempre foi coisa de mulher: um pedacinho de arame ondulado, que antigamente só existia preto, difícil de abrir e que, por isso mesmo, era usado para prender o cabelo das mulheres. Depois o grampo foi evoluindo, começou a aparecer em várias cores e até na pura cor do metal, uma coisa sem graça, pedaço de lata, bem maior que os primeiros.
Mas hoje, na era do Lula e do Gilmar Mendes, essa dupla que serve de tiro ao alvo para o povão, nos bares, nos ônibus, nos trens, nos aviões, nas rodoviárias, nos aeroportos, onde quer que existam duas pessoas, com opiniões formadas ou não, um dos dois ou ambos são objetivos de pedradas.
Pois é. O Gilmar Mendes se queixou do grampo. E não foi pro bispo. Foi pro Lula mesmo. E aí o Lula armou o maior barraco, mandou apear o pessoal da tal de ABIN. Ah, não sabe o que é? Se não sabe o que é, então você é desimportante, não atrai fofocas, não exige que alguém esteja colado na sua nuca ouvindo o que você está dizendo. A ABIN é a agência de bisbilhotices nacionais, que eles chamam de Agência Brasileira de Informações.
Pois essa ABIN andou se metendo na vida do Gilmar Mendes, escutando o que ele falava – mas mais ouvia do que falava – com um senador. O senador fazia uma petição de ouvidos, que o Gilmar Mendes deferia através de interjeições e adjetivos, tipo, “mas isso é grave”, e coisa e tal. Até que o diálogo telefônico saiu na imprensa. Pensa bem, é claro que o Gilmar Mendes ficou puto da cara. Ainda mais com os antecedentes que ele tem, esses de despachar com velocidade supersônica dois “habeas corpus”, num dia só, a favor de um banqueiro. Imaginem que perigo ronda o Gilmar Mendes!
Pois é assim, e o senhor Gilmar Mendes não sabia. Ele, como nunca foi juiz, não podia saber que “juiz só fala nos autos”, que juiz não despacha por telefone. Ele não sabia que o juiz natural, de carreira, discreto por natureza, ou até em razão dos inúmeros processos que o escrivão lhe põe sobre a mesa, não tem tempo para falar sobre seus processos através de telefone e tem tantos processos, que nem pode se lembrar do conteúdo de cada um deles. Então o juiz de carreira não tem medo de grampo nenhum, porque ele não se compromete ao falar no telefone.
E não só os juízes. Qualquer pessoa honesta, seja ela quem for, não tem medo de grampo. Só tem medo de grampo quem tem rabo, quem tem o que esconder debaixo do respectivo rabo. Só tem medo de grampo quem não pode dizer pra todo mundo, alto e bom som”minha vida é um livro aberto”, como o povinho diz por aí.
O cargo público não pode ter segredos. O homem público é o que o adjetivo quer dizer: um homem público. Se esse tal de grampo mexeu com tanta gente, gerou tanta indignação, é porque há coisas, na república, que o povo não pode saber. E isso é mau. Principalmente se o povo não pode saber o que se passa no Judiciário do senhor Gilmar Mendes.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

CRÔNICAS AMOROSAS "AD INFINITUM"

SALMOS PAULIANOS
Paulo Wainberg


Você. Ou tu, tanto faz. Fico no você e no tu.
Você que habita meus pensamentos mais solertes, minhas emoções mais sórdidas, meu ambiente mais transgressor e, quem diria?, mais cafajeste.
Você que freqüenta meus sonhos mais eróticos, minhas fantasias mais obscenas, meus desejos mais primitivos de beijar tua boca, abraçar teus braços, apertar teu corpo contra o meu, de frente, de costas, para lá e para cá.
Você, que me lança olhares sorrateiros logo desviados e que, entre um brinquedo e outro, deixa no ar os limites do permitido e acena com desvarios proibidos e sugestões do que poderia ser.
Você que me seduz sem querer ou por querer.
Você que provoca e silencia, pergunta e não responde, diz e recua, você, tu que invades o momento infinito antes que o sono me conduza e que, nos sonhos, cede e recusa, oferece e nega, aparece e desaparece, qual uma promessa do que poderia ser ou do que poderia ter sido.
Tu que abraças um pouco a mais e deixa, lânguida, tua mão escorrer entre meus dedos, num alô ou num adeus.
Você que me flagra literário e não me reconhece pessoa.
Onde anda você? Onde estás?
Você que promete sem cumprir e... cumpre sem prometer, apenas para manter a ilusão e acelerar a fantasia?
Onde estás?
Talvez não saibas que sou um imenso e interminável coração, suscetível à paixão e à grandeza do amor despojado, do desejo furibundo, da contravenção afetiva, ó minha amada!
Temes, sei lá!, revelações, indiscrições e, porque é assim que é, a perda de posições conquistadas a muito custo, em nome do futuro, do vir a ser.
E acreditas que não sei como fazer para tranqüilizar tua alma inquieta, teus medos e inseguranças?
Ó amada minha, amada assim como és, nunca sofrerás por causa do meu amor porque ele é teu, para você e você será a rainha do meu castelo de areia, do meu palácio de biscoitos, recheados com leite condensado e sabores mis que te elevarão aos prazeres grandiosos, aos sorrisos gratos e devolverão você aos rituais cotidianos, mais rica e mais feliz.
Compensar tua admiração com a sensualidade furiosa que teu corpo exige é, ah minha amada, um desejo supremo a embalar meus dias, minhas noites e meus porres, nos melhores ou piores bares que minhas caminhadas encontram, aqui e ali, nessas ruas da cidade.
Talvez não saibas que entre uma obrigação e outra, entre um dever ou outro, sento em bancos de praça a imaginar-te, imaginar você em meus braços, adorada e quente, ansiosa e trêmula tanto quanto forem a suas emoções, infratoras de amores isentos, projetos vitais e virtuais anseios.
Ah você, amada minha, menina em alma de mulher, mulher em sorrisos de menina, sonhadora e iludida, não se iluda, criança, não atormente seu coração alem dos tormentos que ele pode suportar. Deixe-se conduzir, qual flor nas águas de um rio, ao encontro definitivo com o mar quando, agridocemente perfumada, perceberás a verdadeira natureza da paixão, sua grandiosa intensidade, paixão de dúvidas, de medos e dos mais sufocantes decibéis.
Você, que me lê e não me escuta, que me escuta e não me ouve, que me olha e não me vê.
Onde anda você?
Estou ensurdecido com o clamor do seu silêncio altivo como quem, de um dia para outro, adormece e não acorda.
Você já disse tanto sem falar, coisas que ouvi nos seus olhos, no seu sorriso, na cor de suas faces e a tudo escutei, do jeito que quis escutar.
Você que é meu derradeiro pensamento, antes de adormecer, meu primeiro pensamento ao acordar, você que desconheço e que tanto quero conhecer, não acha que é hora de se apresentar?

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

PIEGUICES

A CATEDRAL DE SANTA MARIA

JOÃO EICHBAUM

No tempo em que não havia esse povo todo que se acotovela, à espera dos ônibus, nem existia também o vai-vem frenético do pessoal que anda à cata de produtos do Paraguai “made in China”, no camelódromo, a catedral dominava, com a inexplicável majestade do silêncio, as atenções de quem passava por ali, naquela parte da Avenida Rio Branco. A Avenida era a artéria que mais pulsava, no dia-a-dia da cidade, ligando a estação ferroviária à Praça Saldanha Marinho e à “primeira quadra”, o “ponto chique” do comércio, das meninas do colégio das freiras, que passavam com seus livros debaixo do braço, dos encontros movidos a suspiros, das rodas de cafezinho, onde se discutiam os sucessos e insucessos da dupla “Rio-Nal”.
A catedral ficava acima disso tudo e eram muito poucas as pessoas que, ao passarem na frente dela, deixavam de fazer o sinal da cruz. Era um templo que impunha sua presença, irradiando uma grandeza que se situava acima de seu sóbrio perfil arquitetônico. O repique de seus sinos, na hora do “angelus”, ao meio dia, nos dobres de finados, no tom festivo da missa das dez, dividia com o silvo das locomotivas os sons que a cidade mais conhecia.
Fruto da tenacidade e da liderança do padre Caetano Pagliuca, sacerdote palotino que, ainda jovem seminarista, deixou sua bela Itália e a família para evangelizar numa terra desconhecida, a catedral sempre foi referência na história de Santa Maria. Por suas naves e em sua abóbada passaram as mãos de outro italiano, Aldo Locatelli, que ali deixou marcada a melhor obra de que já se teve notícia nos domínios religiosos da cidade. Foram meses e meses de labor intenso, meticuloso e paciente, quando ele e os membros de sua equipe se entregaram àquela inspiração que rende emoções, até hoje, para quem se deixa arrastar pelas belezas da arte sacra.
Aos domingos, depois da missa das crianças, o ponto alto era a missa das dez, um acontecimento até mais social do que religioso, freqüentado pela elite da sociedade santamariense, os varões de terno e gravata, o público feminino exibindo o que de mais elegante ditava a moda. Paramentado com a capa de asperges, o “cura da sé”, Monsenhor Frederico Didonet, se dirigia do altar até a porta da catedral, borrifando com água benta o povo cabisbaixo, entregue à suntuosa força da liturgia (estrangulada, mais tarde, pelo Concílio Vaticano II), enquanto o Coral Santa Cecília, sob a batuta da professora Maria Martins entoava o solene “Asperges me”.
E aquele tom solene, quase apoteótico, marcava toda a missa, impregnava os circunstantes com um sentimento de que só é capaz a música dos grandes mestres e a voz dos grandes cantores, como o solo de João Isaia, cantando “Panis Angelicus”, de Cezar Frank.
Ainda mais emotivas, embaladas pelas melodias inesquecíveis que vinham pelas vozes do Coral Santa Cecília, eram as missas “do galo” A catedral então regorgitava de povo, ficava tomada até nos corredores. E o povo lá ficava, contrito, dominado pelo sentido do mistério, até o último acorde da “Noite Feliz”, interpretada num arranjo, certamente de autoria da professora Maria Martins, que incluía o “Gloria in excelsis”. Só então a multidão deixava a igreja, para inundar a Avenida Rio Branco, levando na alma e na voz a alegria incontida de mais um Natal.
Não sei que histórias constrói, hoje, essa catedral que outrora foi ponto de encontro do lírico e do religioso, do emocional e do místico, abrigo espiritual de uma comunidade que era feliz, enquanto vivia seus próprios valores, antes de ser desfigurada pela migração predatória.

(crônica publicada no jornal A Razão, de Santa Maria)

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

TEM DIAS QUE EU NÃO AGUENTO
Paulo Wainberg



Às vezes me pergunto: terei ódio aos políticos? E, com sábia ponderação me respondo: Não.
E acho que é uma boa resposta porque, sem políticos estaremos perdidos definitivamente e não apenas quase perdidos, como andamos atualmente.
Antes dos políticos a humanidade era explicitamente selvagem. Depois deles, graças ao bom capataz da grande planície sideral, a humanidade é implicitamente selvagem.
Nas cavernas o Homem queria e pegava, não pedia licença e não dizia obrigado. Depois, quando o primeiro prefeito assumiu, só ele podia pegar sem pedir licença e sem dizer obrigado.
Para não ser enfadonho, salto alguns milênios e chego aos, digamos, dias atuais.
Graças aos políticos somos civilizados o que, em termos políticos, significa que podemos reclamar quando eles pegam sem pedir licença e sem dizer obrigado, mesmo que da nossa reclamação pouca coisa resulte.
As guerras ficaram mais organizadas graças aos políticos.
A corrupção, graças aos políticos, tem ética.
E graças aos políticos se pode prometer qualquer coisa e, depois da eleição, esquecer, mudar de idéia e fazer exatamente o contrário.
Se não fossem os políticos, qual seria o poder das igrejas? Como é que um time de futebol seria administrado? O que seria das garotas de programa e dos cabarés de luxo?
Como é que uma primeira dama faria o rancho do palácio, se não fossem os políticos?
De que modo um país invadiria o outro, exterminar-se-iam raças e povos, trucidar-se-iam populações inteiras, dilacerar-se-iam tribos, cometer-se-iam atentados terroristas e tomar-se-ia sopa de verduras em albergues, se não fossem os políticos?
Faço um enorme esforço de abstração e não consigo imaginar todas essas coisas sem o sentido profundo do diálogo, do conchavo e do ajuste de interesses pessoais que os políticos introduziram, qual supositório gigantesco, no ânus da civilização.
Não, não posso odiar políticos, suas mútuas reverências, seus nobres gestos, suas grandezas de posição e seu inesgotável, interminável e insaciável desejo de promover o bem comum.
O conceito de bem comum é político e não filosófico e muito menos moral, como pretendem alguns reacionários das idéias, esses tolinhos.
Bem comum, como as palavras parecem que estão dizendo, é ganhar popularidade e votos para a próxima eleição, distribuindo pequenas vantagens ao comum, isto é, ao vulgo, ou melhor, o povão e grandes vantagens aos parceiros de profissão, políticos, tais como cargos rendosos em organizações políticas destinadas a distribuir o bem comum. Ou empregos milionários aos amigos íntimos dos políticos que, por não serem políticos, felizmente estão aí para contrabalançar com o comum, o vulgo, ou melhor, o povão e suas eternas queixas, reclamações, exigências e passeatas de protesto.
Uns chatos, palavra de honra, querendo que os pobres políticos resolvam tudo por eles, até mesmo na hora do licor, do espumante ou, dependendo da hora, do uísque.
Se há coisa que os políticos detestam é o povão, a massa desconhecida, sem nome nem cara que, entra dia, sai dia, se move de um lado para o outro, nas cidades, nos campos e na estrada, sempre se queixando, sempre se queixando.
O coitado de um Senador mal tem tempo de distribuir as tarefas inadiáveis para os seus vinte e cinco assessores, ou então ficar horas discursando num teatro vazio, ou ainda confraternizar com outro pobre Senador que, homem de honra impoluta, acabou de ser absolvido num inquérito parlamentar.
Falando nisso, onde anda o senador Collor? E o Renan Calheiros, esse injustiçado? O que é feito dele, homem que com extraordinário denodo ultrapassou as mazelas absurdas que o povão, esse chato, lhe impôs só por causa de um casinho extra-conjugal e de uma pensão – coisa pouca – que uma empreiteira, por pura simpatia pessoal, pagava por ele. Sem falar nos bois que lhe foram absurdamente atribuídos, com chifres e sem bolas, sem nota fiscal nem relógio ponto? Cadê? Por que ninguém mais fala em Renan Calheiros? Continua ainda proferindo sábias palavras nos corredores e anfiteatros da Egrégia Câmara Alta? Collor, sabe-se, foi estudar inglês em Miami porque, pobre homem, adora ver filme americano sem legenda. Alguém pode me dizer qual foi a última revelação feita pelo Clodovil, Clô para os íntimos, nobre deputado federal? E outros, e outros...
Pois é, e tem gente que reclama que falta dinheiro para o Presidente presidir esse ignaro rebanho humano, chato e inconveniente, só porque todo o ano os deputados e senadores tem que gastar três bilhões e seiscentos mil reais, uma merreca perto do dinheirão que falta para a Saúde.
O povão simplesmente se recusa a deixar o homem trabalhar. Tem gente por aí reclamando da nova CPMF que, agora sim, vai resolver esse problema quinhentista do país, a Saúde.
Felizmente nem tudo está perdido e Roberto Dinamite explodiu o Eurico Miranda da presidência do Vasco e exigiu que o Romário devolva a camisa onze ao time, ora onde já se viu?
Finalmente alguém toma uma atitude neste País!
Por aqui, na terrinha, o(a) Governador(a) ganha sete mil por mês e estão achando ruim passar para dezessete. Para que um(a) governador(a) precisa tanto dinheiro se um brigadiano pode viver com seiscentos e uma professora com mil e pouco, se é que ganha isso?
Não. Decididamente não tenho ódio de políticos. Tenho ódio é do povão, dessa gente chata e ingrata, que só reclama e nunca agradece tudo o que os políticos fazem por eles.
Não adianta, sempre foi assim, ninguém respeita ninguém e querem jogar a hierarquia no lixo.
Onde é que já se viu coisa igual?
Onde?
É fácil meu amigo basta abrir um olho que você verá tudo isso estampado na sua frente, a qualquer hora do dia e da noite, como se fosse uma bofetada permanente, estalando sem parar na sua cara.
É, tem dias que eu não agüento, juro pelas barbas do Toulouse, meu maltês de estimação.

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

VARIAÇÕES EM TORNO DO TEMA FIADASPUTAS

CADEIA PARA OS POBRES,
JUSTIÇA PARA OS RICOS
João Eichbaum

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça que, de agora em diante pode ser denominada a “turma das seguradoras”, decidiu que a família de motorista embriagado, morto em decorrência de acidente de trânsito, não terá direito a seguro de vida.
Sim, é isso mesmo que vocês estão lendo, não é invenção deste escriba, os jornais de todo o país noticiaram a façanha desses senhores vestidos de toga que são pagos com o dinheiro do nosso bolso para fazer justiça – e não a fazem.
Em nome de que interesses assim decidiram, não sei e nem quero saber. O que se quer é justiça e a isso não se pode chamar justiça. Isso é benefício, benefício em favor do ramo mais rico do mundo, que são as seguradoras.
Então se imagine uma família, digamos, composta de quatro crianças, filhas de um motorista de caminhão e de uma mãe que não trabalha. Para se livrar do stress da direção, o motorista resolve tomar dois cálices de vinho e morre, em conseqüência de acidente de trânsito provocado por um filhinho de papai, drogado, que anda a 180 quilômetros por hora.
A família desse motorista vai ficar na miséria, porque o filhinho de papai, comprando testemunhas, “convencendo” policiais rodoviários e “provando” perante o juiz que o motorista do caminhão, por estar embriagado, é que foi o culpado pelo acidente, isto é, o filhinho de papai, por ser rico, vai ser absolvido.
E quem vai lucrar, com tudo isso?
A companhia seguradora, em primeiro lugar, que embolsou, durante anos a fio o prêmio do seguro, sem precisar desembolsar um centavo sequer como contraprestação. Em segundo lugar, bem, em segundo lugar, ponham vocês a imaginação a funcionar: eu é que não sei quem vai ganhar alguma gorgeta.
Isso não é nem justiça, nem interpretação científica do direito. Tal decisão vai na contramão de qualquer idéia do direito constitucional do consumidor, sem falar que desrespeita princípios gerais do direito que ordena: pacta sunt servanda. O seguro se opera em decorrência de um contrato e o contrato é que deve prevalecer. A notícia dos jornais não diz que a “turma” mandou cumprir o contrato, mas sim que arredou o direito ao seguro de vida.
Ainda que um leonino contrato de seguro previsse uma cláusula idiota como essa, o Tribunal tinha obrigação de zelar pela Justiça, ou seja decidir em favor dos beneficiários do seguro, porque, não tendo culpa alguma, esses pagarão pelo que não fizeram, enquanto o Judiciário estará botando dinheiro no cofre das seguradoras.
Uma coisa é certa: os beneficiários não estavam em Brasília, fazendo sustentação oral, mas as seguradoras estavam. Essa é que é a verdade no Brasil: pobre não tem vez nos Tribunais Superiores, formados por apadrinhados, contemplados em razão do sexo e da cor, por gente que faz carreira porque tem fama de jurista, mas não carrega na consciência o dever de fazer justiça, salvo para os ricos. E que venha me desmentir o senhor Gilmar Mendes.

terça-feira, 2 de setembro de 2008

COLUNA DO PAULO WAINBERG

AMOR PERFEITO
Paulo Wainberg


Uma versão:
Narciso era tão belo que se achava um Apolo ou Dionísio. Julgava-se um deus. E como tal desprezava o constante assédio masculino a que era submetido, manifestando tal desprezo sem dó nem piedade.
Amantis, jovem efebo perdido de paixão, tanto incomodou que, para ver-se livre dele Narciso ofereceu-lhe a espada como presente.
Amantis postou-se à porta da casa de Narciso e orou à deusa Nêmesis que fizesse Narciso conhecer a dor de uma paixão não correspondida. Em seguida, com a espada que ganhara de presente, suicidou-se por amor.
Poucos dias depois Narciso apaixona-se perdidamente por um belo rapaz, sem perceber que se tratava de sua própria imagem refletida na água. Todas as suas tentativas de conquistá-lo fracassaram e termina por matar-se com a própria espada, repetindo assim o incontido desespero de Amantis.
Outra:
Narciso, filho do deus-rio Cefiso com a ninfa Liríope, recebeu do adivinho Tirésias o vaticínio de uma longa vida, desde que jamais olhasse para sua própria imagem. Certo dia, às margens do lago Eco, inadvertidamente Narciso observou-se efletido nas águas cristalinas. Tomou-se de paixão por si mesmo e, desesperado, definhou até à morte.
Mas uma:
Ovídio, poeta latino que influenciou de Shakespeare à Keats, em sua obra Metamorfoses, nos dá a versão poética e dramática da lenda de Narciso: A ninfa Eco, seduzida pela beleza sobrenatural de Narciso e por ele desprezada, definha e morre, exalando um débil gemido final. A deusa Nêmesis, indignadíssima com a insensibilidade do jovem, sua arrogância e inútil altaneirice, condena o rapaz a apaixonar-se pela própria imagem, no Lago Eco. Soterrado por tamanho amor impossível, Narciso deita-se à beira do lago e, enquanto se embeleza, definha e definha. As ninfas do lago constroem uma pira e, quando vão buscar o corpo encontram em seu lugar apenas uma flor: o narciso.
Existem outras versões mas, em todas elas prevalece a idéia central: a vaidade exacerbada e o amor exagerado por si próprio.
Entre as superstições gregas da antiguidade, uma das mais poderosas era a de que olhar para si mesmo dava azar. Possivelmente dessa ridícula idéia tenha surgido a lenda de Narciso.
E, com toda certeza, é por isso que o Conde Drácula não se reflete no espelho. E nenhum outro vampiro conhecido e que seja digno desse nome.
Agora o mais impressionante: sabe qual é a palavra que deriva de Narciso? Não? então se prepare, aí vai: Narcótico.
Exatamente, nobres senadores, narcótico deriva de Narciso. O entorpecimento e a insensibilidade derivam de Narciso. A maconha, cocaína, crack, heroína, ópio, marijuana, anestesia local, anestesia geral, tudo isso deriva de Narciso.
Às vezes eu penso cada coisa! Por exemplo: o que seria de Freud sem a mitologia grega? Pois não é que o homem foi lá na antiguidade para diagnosticar em seus estudos sobre a histeria o “amor pelo semelhante” como explicação paras as inclinações homossexuais, na época tidas como patológicas.
Mas adiante Freud concebe o denominado erotismo anárquico, a fase infantil primitiva em que as zonas erógenas se satisfazem independentemente umas das outras como, por exemplo, a criança chupar o dedo. Mais adiante, com o crescimento, há uma organização erótica, chamada de erotismo lógico em que o prazer é coordenado e usufruído pelo conjunto erógeno do indivíduo.
A fase patológica do narcisismo freudiano corresponde ao desejo de retornar ao estado de ideal de ser o único amado, incondicional e constantemente, com obliteração absoluta, na mente, das relações parentais explícitas.
Mais ou menos isso.
Voltando ao assunto... qual era mesmo? Ah, sim, os narcóticos.
O consumidor de drogas não busca exatamente isso, o entorpecimento de sua capacidade lógica de raciocínio para abandonar-se totalmente às emoções primitivas, irresponsáveis e inconseqüentes?
Em outras palavras, sob o efeito da droga o indivíduo pode sentir-se em estado ideal de perfeição e “paz”, amando-se a si mesmo mais do que a qualquer coisa, indiferente ao amor alheio, um soberano e lindo deus que de nada precisa além do próprio amor ao amor-próprio.
Paz absoluta, o retorno ao estado primitivo ideal, uterino, auto-justificável, liberdade irrestrita para nada fazer nem ter que fazer.
Insensível ao seu redor, o drogado despreza os que por ele são, simbolicamente falando, apaixonados: pais, irmãos, amigos, filhos, família. Para não ser incomodado nem retirado de sua magnífica auto-suficiência livra-se dos chatos assediadores escondendo-se ou brindando-os com pequenas doses de lucidez aparente e promessas falsas, não se importando que eles se matem e definhem, também simbolicamente falando.
O castigo para o drogado é semelhante à metáfora de Narciso: definhar, sucumbir, desaparecer, não às margens de um lindo e cristalino lago mas nas águas sujas e fétidas das sarjetas, seus restos apodrecendo em túmulos sobre os quais serão depositadas flores, possivelmente alguns narcisos por algum tempo e, pouco tempo depois, nenhuma flor e, olhe lá, no dia de finados, uma visita rápida.
O drogado não é drogado por escolha, assim como Narciso não escolheu ser Narciso.
É preciso compreendê-lo, eu acho. Entender os vieses psíquicos de sua mente. As carências químicas de seu organismo, seus mecanismos de defesa fragilizados e entender que não é menos do que outros, inferior a ninguém, apenas diferente, é isso, diferente.
Todos temos um Narciso dentro de nós. Saber disto talvez seja o primeiro passo para... sei lá, para olhar para os outros, olhar para fora de si mesmo e aceitar o amor alheio.
Por que estou falando disso? Não sei, hoje acordei assim.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

VARIAÇÕES EM TORNO DO TEMA FIADASPUTAS

OS CHAMADOS HUMANOS
João Eichbaum

A humanidadde, alguma vez na vida, esteve bem? A humanidade, isto é, o mundo inteiro, alguma vez na vida, foi plenamente feliz e satisfeito com o que é e o que tem?
Por que existe entre os homens essa dolorosa divisão de pobres e ricos, de felizes e infelizes, de cabeças boas e cabeças ocas?
Algum “Deus” ou deus encheria o mundo com criaturas assim divididas? Por que alguns estão muito bem e a maioria muito mal?
Terá a humanidade uma administração “divina”?
Olhe, meu amigo, se você pensa que o mundo é administrado por uma divindade, você vai ter que me explicar as razões dessas diferenças. Será um descuido dessa “divindade”? Bem, se for descuido, essa administração não pode ser divina. Deus nenhum se distrai, nem faz coisas sem pensar. A distração não é um componente da perfeição e todo o “Deus” deveria ser perfeito, assim como lhe atribuem os qualificativos de onisciente e onipresente.
Mas, se não é por distração é por intenção que existem tais diferenças. E nesse caso também não se pode admitir “divindade” alguma como regente desse mundo. Deus nenhum iria criar, voluntariamente e gratuitamente, tais distinções, fazendo uns homens pobres e outros ricos, uns felizes e outros infelizes, só para se divertir, para se esbaldar à vontade em cima da miséria. Deus nenhum teria critérios plausíveis para dar tudo para alguns poucos, e nada para a grande maioria.
Essa é a única maneira de afastar toda e qualquer divindade da administração desse mundo de, cheio de guerras e ódios, cheio de líderes aproveitadores, cheio de tiranos físicos e morais.
Então, meu amigo, convença-se: nenhum de nós é escrínio de dignidade, coisa nenhuma. Todos nós, os que constituímos a chamada humanidade, tivemos a sorte (alguns, outros o azar) de ter evoluído um pouco mais do que os chimpanzés e os bonobos, dos quais herdamos, contudo, todos os defeitos e qualidades, que se resumem em dois pontos: ambição pelo poder e sexualidade. A palavra “´poder” aqui deve ser entendida no seu mais amplo sentido. Nem todos gostaríamos de ser políticos, mas todos gostaríamos de ter o “poder” econômico, ou seja, a disposição de todos os meios que realizassem nossos desejos de felicidade.
A diferença entre Bill Gates e um índio internado no fundo da Amazônia, que desconhece a chamada civilização, a diferença entre um Lula que ficou rico em cima do poder e um pobre operário que vai morrer com a miserável pensãozinha do INSS não pode ser atribuída a “Deus” nenhum. Só a nossa ascendência explica isso.