sexta-feira, 3 de junho de 2011

LIÇÕES DE DIREITO PARA AUXILIARES, SECRETÁRIOS, ASSESSORES E ESTAGIÁRIOS DE JUÍZES, DESEMBARGADORES E MINISTROS

O VOTO DO FUX (IV)

João Eichbaum
“A doutrina da perspectiva objetiva dos direitos fundamentais tem
berço no direito alemão, forte na consagração dos direitos fundamentais
não só como direitos subjetivos do indivíduo em face do Estado, mas
também como decisões valorativas de cunho objetivo da Constituição,
espraiando sua eficácia sobre todo o direito positivo, de modo a orientar o exercício das funções legislativa, administrativa e judiciária
- assim continua o voto do Fux.
“A doutrina da perspectiva objetiva”...Rimou, não é? Parece até trova gaúcha. Mas é como verso de pé quebrado: dói nos ouvidos.
Essa doutrina, diz o Fux, tem berço no direito alemão.
Sim, mas, e daí? O que é que acrescenta isso? O que é que nós temos a ver com o direito alemão, nós, um povinho bem tropical, cheio de bossa, do qual fazem parte mulatas bem providas de carne e olhos verdes?
E mais, porque é que ele não cita o pai da idéia? Porque é que ele não identifica o dispositivo legal alemão que consagra explicitamente essa tal de doutrina da perspectiva objetiva?
Se o fato de haver nascido em berço alemão pesasse alguma coisa como argumento, tudo bem, o Fux poderia ter dispensado citações, mas essa origem não é fundamento suficiente em si mesmo para valer como razão de decidir (é preciso não esquecer que se trata de um julgamento e não de uma aula). Cada povo tem os seus costumes, as suas crenças, o seu jeito de ser, as suas idiossincrasias. Transplante de lei é coisa de quem não tem criatividade.
Mas, continuemos: forte na consagração dos direitos fundamentais...
Forte é adjetivo. E aqui se supõe que desempenhe a função de adjunto adnominal. Todo mundo sabe o que significa “forte”: robusto, vigoroso, corpulento, consistente, sólido, destemido, valente, convincente, etc.
Todo mundo sabe também que um adjetivo não subsiste sozinho como expressão. Ele não tem vida própria. Sua significação só se afirma quando ele se pega num substantivo.
Então, eu pergunto para vocês: como adjunto adnominal a que nome se refere o “forte”, nesse rolo do Fux? “ À doutrina da perspectiva? Ao berço? Ao direito alemão?
Ninguém sabe. Nem ele, o Fux, certamente, porque, se o soubesse, trataria de redigir um texto no qual se destacasse com clareza o qualificativo. Mas, vamos tentar dissecar o texto, experimentando o adjetivo “forte” com todos os substantivos que o precedem (vamos fazer de conta que não existe aquela vírgula safada e sem graça depois de direito alemão, separando os virtuais substantivos do adjunto adnominal)
A doutrina da perspectiva objetiva dos direitos fundamentais...o berço... o direito alemão...forte na consagração dos direitos fundamentais não só como direitos subjetivos do indivíduo em face do Estado, mas também como decisões valorativas de cunho objetivo da Constituição, espraiando sua eficácia sobre todo o direito positivo, de modo a orientar o exercício das funções legislativa, administrativa e judiciária.
Não. Não dá. Falta o verbo. A oração do Fux está aleijada. Gerúndio (espraiando) e infinito (orientar) são formas verbais que identificam apenas as orações subordinadas. Isso quer dizer que o Fux tentou fazer um período sem oração principal.
Chega de confusão por hoje.
Ah, sim, vocês queriam saber o que é que o Fux disse, não é?
Pois eu respondo: nada, bosta nenhuma. Pela simples e primária razão de que sem verbo não existe oração. Com essa redação o Fux não seria aprovado nem numa seleção pra auxiliar de serviços gerais.

Nenhum comentário: