João Eichbaum
Entre os primatas, tudo é
possível. Aquele velho ditado “vou morrer e não vou ver tudo” serve exatamente
para mostrar a imensa capacidade que o primata tem de surpreender, indo da
total ausência de racionalidade ao extremo uso da razão. Dentro desse campo,
quase infinito, tudo pode acontecer. Partindo-se desse pressuposto, nada nos
poderá causar surpresa.
O cristianismo inventou um
rito, a que deu o “status” de sacramento, chamado “eucaristia” ou “comunhão”.
Segundo a mitologia cristã, Jesus Cristo, um deus que, desfalcando, no céu, o
trio chamado Santíssima Trindade, veio para terra, depois de passar pelos
órgãos reprodutores de uma virgem, se fez homem. Aqui, entre outras coisas,
depois de um jantar regado a vinho, disse que o vinho era o sangue dele e o pão
que acompanhava a ceia, o seu corpo. E teria instado a todos que “comessem o
seu corpo e bebessem o seu sangue”.
O mito foi transformado em
rito e até hoje é praticado pelo cristianismo.
Tempos houve em que a
“primeira comunhão” era quase um requisito de cidadania. Quem não tivesse
tomado a dita “primeira comunhão” seria olhado de soslaio na sociedade. Havia
festa, as meninas se vestiam de noiva, os meninos, de terno e gravata, também
pareciam noivos.
Hoje, a “primeira comunhão”
perdeu sua condição de “requisito de cidadania”. Acredito que a maioria, ou
significativo número de pessoas pelo menos, não participam desse rito.
Mas ainda há pessoas de
pouca ou nenhuma instrução que não o dispensam, porque a absorção do mito lhes
roubou o espaço da racionalidade.
A imprensa noticia que uma
senhora, em Bom Princípio, não admitia que seu filho, autista, ficasse sem “o
corpo e o sangue” de Jesus Cristo. Por isso, combinou com o padre que ensaiaria
com a criança a teatralização da eucaristia, para que ele participasse, com
outras crianças, do ritual da “primeira comunhão”. No dia da festa, diante da
Igreja lotada, inclusive com parentes e
amigos convidados pela família da criança, o padre mandou retirar o menino da
fila dos comungantes, sob a alegação de que o autista não compreende a
significação do ato religioso.
Foi um auê, naturalmente, a
comunidade se revoltou, houve lágrimas, desconforto, foram ao bispo. Constrangido, o padre negou o óbvio, o preconceito.
O menino, é claro, “não ta
nem aí”, mas a mãe, sobretudo, sofre, pagando o preço de ter se entregado
incondicionalmente a uma lavagem cerebral, que a impede de raciocinar.
Para quem olha à distância,
é a Igreja mandando às favas “os direitos humanos”, porque Jesus Cristo só se
interessa pelas pessoas sãs (leia-se pessoas com capacidade produtiva, já que,
sem apoio financeiro, as religiões podem desaparecer e Deus com elas).
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