E A VIDA CONTINUA
João Eichbaum
A mitologia cristã e outras religiões atribuem a uma divindade a criação
do mundo e dos animais que nele habitam, entre os quais se salienta essa
criaturinha difícil chamada ser humano.
O trabalho, assim impropriamente dito, porque outra coisa não seria senão
puro e simples monólogo dessa deidade, sem queima de uma só caloria, (“faça-se,
isso, faça-se aquilo”) teria sido concluido em seis dias. A despeito da
ausência de qualquer esforço físico, o ente divino sentiu necessidade de
descansar no sétimo dia.
Mas, isso é tema de Direito do Trabalho. O que eu quero mesmo é falar
sobre o mundo que os homens criaram, em cima daquele mundo que, segundo os
mitos religiosos, lhes teria sido entregue pela divindade.
Alçado à condição de obra prima dessa criação, o ser humano evoluiu. Da
ignorância total - antes que a “serpente” lhe despertasse a curiosidade para o
conhecimento – ele foi aprimorando a própria inteligência, até atingir um
domínio magistral da ciência, que só o não protege, por enquanto, contra os
maus humores da natureza. Ele chegou a um ponto a que divindade nenhuma chegou.
Nem mesmo a cristã conseguiu tal proeza, apesar do preço de sangue, pago por um
de seus rebentos.
O homem domina as próprias relações entre os da sua espécie.
Explico. A divindade criadora, irada, vingativa por ter perdido para a
lábia da serpente, expulsou o homem do paraíso, entregou-o ao deus-dará: te vira,
te multiplica, vai ganhar o pão com o suor do teu rosto, acabou a moleza.
Foi assim, no início. Perdido, sem rumo, entregue às feras, deserdado
pelo “pai” que o criou, o homem comeu o pão que o diabo, ops, a serpente
amassou. Mas a dor o ensinou a gemer. Com esforços próprios, ele se livrou do
jugo da escravidão e da dependência da divindade: evoluiu.
Hoje, só se “multiplica” quem quer. Só “sua” quem não conhece
informática, e para ter moleza basta ser político. Quer dizer, dominando a
informática, o homem, hoje, domina o mundo, e o mundo outra coisa não
representa, senão as relações humanas que permitem a vida.
Hoje, gênios em informática – leia-se “hackers” – têm esse mundo em suas
mãos. Eles podem instaurar o caos em toda a face da terra, se o quiserem,
fazendo algo que nem o dilúvio da literatura bíblica conseguiu. Com a
interrupção das informações, podem deixar o mundo sem energia, sem água, sem
gás, sem a tecnologia da saúde, além de provocarem quedas e colisões de aviões,
naufrágios de transatlânticos, choques de trens.
Dependendo de sua inteligência, o homem pode destruir o mundo, antes que
o faça qualquer divindade.
Felizmente, os “hackers” não cogitaram disso no dia 21 de dezembro, os maias se desmoralizaram e o
mundo continuou habitado pelo bicho homem.