quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

EXPRESSÃO OU INSULTO?

João Eichbaum

O massacre – a palavra é essa mesmo, massacre – ocorrido em Paris mexeu de tal ponto com milhões, ou quem sabe bilhões de pessoas, que é impossível não continuar falando nele. O assunto do momento é o chamado “direito de expressão”, por conta do qual teriam sido publicadas, impunemente, charges ofensivas ao representante do deus dos muçulmanos.

O resultado, todo mundo sabe: se as leis da França não punem insultos contra religiões, os adeptos de Maomé assumiram a tarefa da punição, em nome do ofendido. E deu no que deu.

É uma coisa muito simples, mas muitos doutores e intelectuais dos mais variados níveis não atinam com a distinção entre “expressão” e “insulto”. Existe, sim, o direito de expressão nos regimes democráticos. Se todos fossem condenados ao silêncio, se a todos fosse imposta a obrigação de engolir cobras e lagartos não haveria democracia.

Mas, “direito ao insulto” não existe. Ninguém tem o direito de expor ao ridículo a quem quer que seja. Esse “direito” a lei brasileira não reconhece. Quem insulta, responde pelo insulto, perante os tribunais. E estamos conversados. O “direito de expressão” diz com o direito de liberdade, é decorrência da liberdade democrática e favorece manifestações de crítica, de divergência, de opinião pessoal. Não envolve, porém, o direito à agressão, à ofensa, à humilhação.

Sendo a ofensa um sentimento negativo pessoal, nenhum terceiro tem o direito de tomar as dores do ofendido. Se eu ofender a Maomé, que vá ele aos tribunais, ou que mande raios para me destruir. Mas ninguém tem o direito de se doer por ele, exigindo reparação.

Na realidade, os redatores e chargistas do Charlie Hebdo confundiram “direito de expressão” com “direito ao insulto”, se servindo desse como matéria para um humor com mais deboche do que graça. Passaram dos limites, como também dos limites passaram, e muito, seus algozes. A diferença consiste em que esses últimos eram energúmenos, de inteligência obscurecida pela lavagem cerebral da religião, que promete 72 virgens para cada um depois da morte, e aqueles, tidos como intelectuais.

Qualquer pessoa de bom senso condena o ato hediondo da matança coletiva. Mas, se em vez disso, tivessem os chargistas e redatores levado uma sumanta corretiva, o resultado seria outro. Eles serviriam de matéria para charges de fazer rir a Maomé, e o mundo teria sido poupado dessa comoção, que ninguém sabe onde vai dar.


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