terça-feira, 13 de janeiro de 2015

PLANETACHO
tacho@gruposinos.com.br

Do Bar Ideal aos
chargistas franceses

Nos  anos 70, meu pai tinha um pequeno bar, chamado Bar Ideal. Eu era um piá de dez anos de idade e passava os dias  lá, desenhando. À noite, jogava damas com o “velho” e seus  amigos, ficava ouvindo piadas, anedotas, histórias de assombração. Sempre ouvindo e desenhando.

Não se falava de política. Vivíamos em plena ditadura militar e o Bar Ideal ficava a uma quadra de um quartel. O pai aconselhava que eu nunca me envolvesse com a política. Para ele, se envolver com “este tipo de coisa” era cutucar onça com vara curta.  E eu ali seguia ouvindo e desenhando.

Em meio ao ambiente daquele pequeno bar meus rabiscos foram seguindo os caminhos do humor. Ouvir, ler e desenhar era minha rotina.  Mais tarde, já adolescente, comecei a jornada como chargista no Jornal Vale do Sinos (na época, um semanário), isto em 1976, ainda em plena ditadura. 

De lá para cá se vão quase quatro décadas. Os trágicos acontecimentos de Paris esta semana me levaram a refletir sobre tudo o que vivi nos últimos 39 anos neste ofício. E só agora me dei conta que ser chargista neste planeta vai muito além de cutucar onças com vara curta. É cutucar radicais de todas as tendências com um toco de lápis da Faber Castell...

Nestes anos todos critiquei e ironizei  ditadores, presidentes, papas, aiatolás, prefeitos e vereadores... Treinadores, clubes e torcedores... Critiquei o mundo... Direita e esquerda... Sempre ouvindo, lendo e desenhando como nos tempos do Bar Ideal.

Por que cargas d’água, só agora, que este traço limitado e trêmulo surgido no balcão do Bar Ideal tem espaço em sete jornais  do nosso Rio Grande, é que fui lembrar do conselho de meu pai? Em certo momentos chego a imaginá-lo ao meu lado dizendo:

– Depois não diz que eu não te avisei...



Um comentário:

Gigi disse...

Adorei a crônica e é uma pena que, provavelmente, aqui na Boca do Monte eu não tenha acesso com mais frequência às publicações e desenhos do autor. Mas, um conselho eu lhe dou: por mais imprudente que se levante, dia desses, não implique com Maomé. Não diga que não avisei!