DEUS NÃO PAGA IMPOSTO
João Eichbaum
Parece que os integrantes da Santíssima Trindade não falam a mesma
linguagem, ou talvez nem sempre funcione entre eles a telepatia, assim no céu,
como aqui na terra não funciona a Internet. Deus, também chamado Pai, por
exemplo, não segue as regras de Jesus Cristo em matéria fiscal. Quando lhe passaram
uma moeda e lhe perguntaram maliciosamente sobre sonegação ou – vá lá - sobre
imunidade de tributos, o Cristo respondeu, sem pestanejar e sem morder a língua:
“Dai a Cézar o que é de Cézar”.
Deus, o Pai, já não afina por esse diapasão. No preâmbulo da
Constituição brasileira de 1988, ele figura como protetor dos constituintes e
foi em troca dessa proteção, certamente, que as instituições religiosas
deixaram de dar a Cézar o que é de Cézar: não precisam pagar impostos, têm
ampla, geral e irrestrita imunidade.
De modo que, amparadas no art. 150, inc. VI, letra “a” da Constituição
Federal e se atrelando também à extensão proporcionada pelo § 4º, do mesmo
dispositivo, essas entidades se livram de um peso de que não escapam os que
trabalham nesta república, os que ganham o pão com o suor do próprio rosto e
têm que aguentar as filas do SUS.
Nem os pobrezinhos que tiverem tido a sorte de comprar terreno e
construir em cima dele um barraco escapam de pagar imposto para ter um teto. Na
hora de pagar o IPTU eles perdem a sensação de felicidade. Deus, ao contrário, mora
sem pagar IPTU tanto em igrejas de pau a pique como em catedrais de luxo. E
seus representantes pegam carona nessa regalia.
Não é preciso dizer que padres, pastores, bispos, arcebispos, cardeais e
assemelhados não sabem o que é batente. Não sabem o que é o cotidiano dos
pobres, o que é pular da cama de madrugada e ir para a parada do busão, ser
nele apertado ou bolinado até o local de trabalho. Quer dizer, eles não sabem o
que é construir um país, o que é contribuir para a elevação do PIB. Só sabem
usar seu patrimônio para arrecadar dinheiro e apojar juros, construindo mais
templos (leia-se fontes de arrecadação).
Quer cobrando dízimo, quer comercializando cada ato que exija a
intervenção de Deus (batizado, casamento, enterro, missa) as religiões faturam
o que muitas microempresas nem sonham. E isso, pela singela razão de que “Cézar”
não dá moleza, não concede regalias para quem trabalha e constrói o país.
A boca dos hipócritas e dos que ignoram o texto constitucional se enche
para propalar que o Brasil é um Estado “laico”. Na verdade, este país não passa
de um lacaio de seitas e crendices. A receita, de que abre mão, poderia atenuar
a amargura da pobreza, incrementar a educação, humanizar a saúde e proporcionar
mais segurança aos cidadãos. Mas, a
Constituição de certo espera que, antes do Juízo Final, Deus se lembre de que
existe o Brasil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário