sexta-feira, 17 de julho de 2015

O JUDICIÁRIO APANHA DA EXEGESE

João Eichbaum

Alguém precisa avisar aos juízes do Rio Grande do Sul que a Constituição é Federal, mas vale também para o território gaúcho. Seu artigo 2º aqui está sendo ignorado. Para quem não sabe: os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário são independentes e harmônicos entre si.

As normas constitucionais que definem a estrutura do Estado comandam as demais normas. Por exemplo, as que elencam os direitos e garantias individuais não se sobrepõem às primeiras. Assim, a norma do inc. XXXV do art. 5º não tem caráter absoluto, a ponto de exigir que tudo passe pelo Judiciário, com atropelo do estatuído no art. 2º.

Ao estabelecer que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, a Constituição está regrando atividades do Poder Legislativo. Apenas isso. Mas, aqui no RGS os juízes estão interpretando essa norma como carta branca para que o Judiciário se sobreponha ao Poder Executivo.

Em outras palavras, o Judiciário está ordenando o que o Executivo pode ou não pode fazer, está se intrometendo na esfera da administração do Estado. Primeiro, deferiu ordem para que não houvesse parcelamento nem atraso nos vencimentos dos servidores. Agora, impõe a distribuição da verba destinada à saúde.

Ora, limitado pela baixa arrecadação, o Estado não dispõe de numerário suficiente para atender a todas as necessidades e obrigações. Nessas circunstâncias, cabe ao Executivo e não ao Judiciário, a eleição de prioridades, o jeito de usar o cobertor curto.

O pior é que os municípios se valem do mandado de segurança para cobrar dívidas, e os magistrados o aceitam. Isso é uma escandalosa revelação de que a cultura jurídica dos juízes gaúchos está comprometida pela ignorância de noções primárias de hermenêutica. Falta de dinheiro é matéria de fato, que escapa à área de abrangência da proteção ao “direito líquido e certo” pela via do “mandamus”.



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