CHORAMOS, POR QUE ELE NOS FEZ RIR
João Eichbaum
Agora eu conheço a dor de morrer aos poucos. É quando a vida vai nos
roubando os amigos. Quando nos rouba o sorriso deles e mais do que o sorriso,
as gargalhadas. Quando nos rouba a sua voz, o seu jeito peculiar de serem eles
mesmos, de não se igualarem a ninguém. Quando nos tira um companheiro de
cerveja, um companheiro de piadas, um companheiro de sarro nas segundas-feiras,
depois do feio futebol de domingo.
Pior ainda, quando nos rouba o talento, o talento que vem do amigo, e
que não passará para mais ninguém.
Não me perguntem quando foi que li, pela primeira vez, um texto do Paulo
Marinho. Perdi a conta. Faz muitos anos, duas, três décadas, não sei. O que sei
é que o talento dele me enfeitiçou. O seu jeito de dizer as coisas, o seu jeito
de pintar a vida, o seu jeito de fazer rir de mim mesmo. O seu jeito de me
fazer chorar de rir.
Só ele conhecia os meandros do verdadeiro humor. Porque dominava as
palavras, encontrava o adjetivo certo, o verbo que cabia no momento, o advérbio
que enfeitava a frase.
E desde que o li pela primeira vez, jamais deixei de lê-lo, mas sempre
espicaçado por uma frustração: a de não conhecer pessoalmente o autor daqueles
textos que me faziam virar as páginas do jornal à sua procura.
Até que um dia, por uma circunstância qualquer dessa vida, nos
encontramos, e aquela frustração deu lugar a um sentimento que qualquer um
gostaria de viver: o do orgulho de ser amigo de um dos maiores cronistas do Rio
Grande do Sul.
Irriquieto, sequioso pela vida, de repente ele resolveu sair, falante e
feliz, por esse Brasil afora, em busca de novas realizações. Esteve
desaparecido por longo tempo. Mas, através de suas crônicas nos reencontramos e
eu tive a glória de trazê-lo para este blog. Logo, porém, a doença começou a
dar sinais, obrigando-o a se despedir da vida aos poucos.
O destino lhe foi cruel, despiu-o, pouco a pouco de suas alegrias, e no
lugar delas colocou a dor, o vazio, o regresso para o nada.
Até que, domingo passado, no dia do seu aniversário, ele nos deixou para
sempre.
Nunca pensei, meu grande amigo, que iria chorar, um dia, por quem mais
me fez rir na vida. Adeus, Paulo Marinho.
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