sexta-feira, 1 de março de 2013


UMA ESTATÍSTICA PIEGAS

João Eichbaum

Estudo publicado no jornal “O Estadão” afirma que a perda que os jovens mortos na boate Kiss tiveram foi de doze mil anos. Diz o artigo: A tristeza provocada pelo incêndio da boate Kiss em Santa Maria é incomensurável para famílias e amigos dos 239 mortos. Mas se há um número que se aproxima da dimensão da tragédia é o de anos potenciais de vida perdidos naquela madrugada de 27 de janeiro. Em poucos minutos, 12.412 anos que estavam pela frente das vítimas perderam a possibilidade de serem vividos.
Entenderam? Ah, pois é. Eu também não. Suponho que os autores do artigo, fizeram a soma, a partir dos anos que cada vítima poderia ainda viver, e deram esse número para impressionar a platéia.
 Hipóteses, nada mais. Principalmente uma hipótese idiota: a de que as vítimas vivessem num país de plena segurança, onde ninguém morre assaltado, em acidente de trânsito, nem está sujeito a doenças graves como o câncer. Sem falar em AIDS e outras coisas menores.
Mas, não é só isso. Lá havia gente se divertindo e gente trabalhando, havia doutores e havia estudantes, havia gente que ganhava pouco e havia gente que ganhava nada.
Então, meus amigos, essa estatística nada resolve: perdas não se padronizam.
 Os que morreram trabalhando vão deixar para os beneficiários a mísera pensão acidentária do seguro social. Os outros vão discutir valores.
E a injustiça social vai continuar depois da morte. Querem ver?
Vão me chamar de sádico. Os familiares e amigos das vítimas vão me odiar. Mas, não sou sádico. Sou realista.
O incêndio foi uma coisa horrível? Claro que foi. Uma dor incomensurável. Ninguém diz o contrário. Mas o que é que vamos fazer, se as pessoas que lá morreram escolheram esse tipo de morte?
Sim, gente, sejamos realistas. Só estavam lá por obrigação, levados a cabresto pelo destino, aqueles que precisavam do emprego para viver. Esses, mais do que ninguém, são vítimas. Vítimas do destino, vítimas da necessidade, vítimas da pobreza.
Vamos ser sinceros: o cara vai com a namorada numa boate para se divertir?
Ora, gente, tem tanto jeito melhor, e muito melhor, de se divertir. Ninguém me convence que, se apertando numa  boate, alguém se diverte.
Ora, vai num barzinho, vai para um motel, vai para um clube, para um bailão, para um lugar arejado. Olha que Santa Maria é um inferno de quente. Se amontoar daquele jeito, numa noite horrível de verão, é modo de se divertir?
Se o cara estava a fim de mulher, se a mocinha estava a fim de apostar na sorte de topar com um príncipe encantado, tudo bem. A morte até que tem desculpa. Mas o que não tem sentido é ir com a namorada para um inferno desses.
Não, por favor, me entendam. Não estou culpando as vítimas, estou apenas dizendo que elas, as que foram para lá em busca de diversão, escolheram esse jeito de morrer. Só isso.
A única verdade da vida é a morte. Só que uns escolhem o modo de morrer. Jesus Cristo já dizia: quem procura, acha.
Agora, façam o seguinte raciocínio comigo: a morte da faxineira que não estava se divertindo, ganhava salário mínimo e não era jovem, vai render X; a morte da menina que não trabalhava, mas iria se formar em curso superior vai render X+Y; a morte do doutor, que estava fazendo especialização, vai render X+Y+Z.
Então, por favor, vão enganar outros com estatística condimentada à base de pieguice.

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