ORGASMO RETARDADO
João Eichbaum
joaoeichbaum@gmail.com
Quarta-feira, dia 31 de
julho, foi o dia mundial do orgasmo.
Tem gente que não sabe
o que é isso. Quer porque, fora dos deveres epitalâmicos, os mandamentos de
Deus o proíbam. Quer porque os votos de castidade sejam a garantia de que,
depois da morte, rola coisa melhor que sexo. Quer porque o parceiro não seja lá
essas coisas, quer por pura birra da natureza, tem gente que não sabe o que é
isso. Tem gente que nunca sentiu a explosão da química que se alastra pelo
corpo inteiro, passando em "teipe" a desimportância da vida e da
morte, naquele momento único, que só vai se repetir, sabe Deus quando.
É, tem gente que
não sabe o que é subir ao céu de corpo e alma, sem sair da cama, e sem ser
profeta, nem virgem. Tem muita gente que nunca precisou passar pelo
constrangimento de ter que explicar para a vizinha que "não, ta tudo bem,
eu só tava sonhando". Tem gente que até hoje só gemeu de dor, grunhiu sóde
raiva e suspirou só de tristeza.
Na noite de 31 de julho
passado, não se ouviram desatinos se decompondo em “ai,ai,ai e ui,ui,ui”,
escapulindo por indiscretas janelas e desassossegando os insones, nas ruas de Santa Maria. Não foi
preciso chamar polícia, nem bombeiros, para botar ordem nos apartamentos.
Em compensação, no dia
seguinte, a praça se encheu com buliçosos gritinhos histéricos e sons acres de
revolta e indignação. Estrondos desafinados de mal-aventuranças se espalharam
por entre as ramagens da praça centenária e mal chegaram ao coreto, exatamente
na contramão da sinfonia abemolada do orgasmo.
Eram os descontentes
com a vida, com a própria vida, engendrando um réu que lhes servisse como
objeto de vingança, um Judas que fosse o responsável pelas armadilhas que o
destino lhes colocou na vida. Era a turma dos revoltados, dos que acham que a
vida só melhora se tirarem certas pessoas do seu caminho, dos que pensam que a
vida é privilégio deles, que a ordem não importa, que a vida dos outros não
pode ser melhor que a deles, que a felicidade geral da nação e do povo
santamariense em particular passa pelo umbigo deles. Queriam a "responsabilização" do prefeito pelo incêndio da Kiss
Há muita diferença
entre uma passeata ordeira e silenciosa, reunindo um milhão de pessoas, que
saem à rua pleiteando o que todos necessitam, saúde, segurança, educação e
transporte, e um grupelho agarrado às próprias insatisfações, enroscado no
próprio ego, como se em torno dele girassem todas as questões do universo, e
exigindo o que só pode ser exigido pela comunidade como um todo.
Só os desassistidos de
bom senso, os desprovidos de “semancol”, os empanturrados de egoísmo, os comunistas do PSol e de outros partidos do falecido comunismo, acham que
podem mudar tudo aquilo que foi estabelecido pela ordem, pelas normas de
convivência, pela necessidade de harmonia em todos os grupos sociais. Só gente
desse tipo pensa que as instituições são coisa descartável, como camisinha
usada, chinelo de dedo sem tira, chiclete mascado.
Não é só a química da
testosterona que provoca prazer. A vingança também é uma espécie de gozo, que
desata eletricidade semelhante à do orgasmo. E, quem não alcança orgasmo por
outro modo, apela para o substitutivo, a vingança. Afinal, ninguém vive sem
prazer. E qualquer prazer diverte os insatisfeitos, a começar pela
desgraça dos outros.
Por isso, teve gente
que comemorou o dia do orgasmo 24 horas depois. Sem a ressaca do sexo.
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