LIÇÃO DE DIREITO PARA
BACHARÉIS E DOUTORES
João Eichbaum
Usando a linguagem bíblica: Celso de Mello não foi um caniço
agitado pelo vento. Mostrou que, com empenho e inteligência, é possível
esmagar, reduzir a pó, triturar uma montanha de pedras.
Ele esteve longe de mostrar medo ou insegurança diante da
gigantesca pressão que lhe impuseram. Consciente da robustez de seus
argumentos, reagiu serenamente à ameaça da montanha que ameaçava soterrá-lo.
Sem levantar a voz, calou o grito das ruas, dando um simples recado: a Justiça,
cimentada na lei, é o antídoto contra as paixões, não se deixa levar pelo
arrastão popular. Com sabedoria e mostrando domínio da ciência jurídica, ele
calou seus colegas que queriam que ele "jogasse para a platéia", assim
como a matilha de ignorantes entrincheirados na imprensa, que não se pejavam de
abrir a boca para dar pitacos sobre o não sabem.
O ministro começou seu voto com um impressionante
rastreamento da história dos embargos infringentes no ordenamento jurídico
brasileiro. Nesse caminho, revelou um episódio tão importante que se
transformou na pedra de toque do voto: a tentativa frustrada de suprimir o
referido recurso, provinda de projeto de lei do Poder Executivo, pretensão que
foi abortada, por obra do então deputado gaúcho Jarbas Lima, em cuja ligeira
biografia Celso de Mello não esqueceu de ressaltar a presidência do Sport Clube
Internacional.
Pronto, com isso estava desmontada a tese de que o Regimento
Interno do Supremo Tribunal Federal, que dispõe sobre os embargos infringentes,
tinha sido revogado “tacitamente” pela Lei 8038. O rastreamento histórico
demonstrou exatamente que o Legislativo não quis revogar aquele dispositivo.
Assentada essa premissa, o voto teve alicerces inabaláveis.
Foi um voto exemplar, como deveriam ser todas as sentenças, todos os acórdãos,
todas as aulas de Direito.
Se todos os juízes, desembargadores e ministros tivessem
capacidade para esgotar uma questão, sem deixar pedra sobre pedra, como fez
Celso de Mello, a Justiça seria respeitada e célere, porque não haveria lugar
para recursos.
Celso de Mello, certamente, não tem “estagiários” em sua
equipe. Se os tiver, incumbe-os de carregar processos, ou papéis, de um lado
para outro, mas não para proferir sentenças, como o fazem muitos juízes e desembargadores.
Ou, quem sabe, se costuma valer-se deles para tal
atividade, desta vez os dispensou e botou a trabalhar gente qualificada a fim
de compor seu voto.
É o fim do assunto para a imprensa, para os palpiteiros, para
os energúmenos intoxicados de ignorância. E espera-se que juízes,
desembargdores e ministros, cheios de vaidade e vazios de sabedoria e
responsabilidade, tenham assimilado a lição.
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